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Animação Social em Lares de Terceira Idade - Luxo ou Necessidade?
O Envelhecimento é um processo universal, inerente a todos os seres vivos (Aiken, 1995). Vários autores dividiram o processo de envelhecimento em três componentes, sendo o primeiro o processo de envelhecimento biológico, resultante da crescente vulnerabilidade e maior probabilidade de morrer, o segundo o envelhecimento social, em relação aos papéis sociais adaptados às expectativas da sociedade, e o terceiro o envelhecimento psicológico, definido pela auto-regulação do indivíduo a nível da tomada de decisões e opiniões.
Estes três componentes do envelhecimento têm uma influência decisiva no comportamento do Idoso. Ao longo do processo de envelhecimento, as capacidades de adaptação do ser humano vão diminuindo, tornando-o cada vez mais sensível ao meio ambiente que, consoante as restrições implícitas ao funcionamento do idoso, pode ser um elemento facilitador ou um obstáculo para a sua vida.
Com o declínio progressivo das suas capacidades físicas, e também devido ao impacto do envelhecimento, o idoso vai alterando os seus hábitos e rotinas diárias, substituindo-os por ocupações e actividades que exijam um menor grau de actividade.
Esta diminuição da actividade, ou mesmo inactividade, pode acarretar sérias consequências, tais como redução da capacidade de concentração, reacção e coordenação que, por sua vez, podem provocar processos de auto-desvalorização, diminuição da auto-estima, apatia, desmotivação, solidão e isolamento social.
O psicólogo deve ter como objectivo ajudar o idoso a encarar o seu envelhecimento como um processo natural, de forma positiva e adequada, e a reconhecer a necessidade da manutenção das actividades físicas e mentais após os 65 anos (idade a partir da qual se considera que o indivíduo entra na Terceira Idade). (Morgenstern, 1992)
De acordo com um estudo realizado por Birouste e Martineau em Lares de Idosos e Clubes de Terceira Idade, as áreas ocupadas pelo psicólogo são as áreas do trabalho (formação e selecção dos funcionários), a área sanitária e social, incluindo-se aqui a Saúde Mental, o sector educativo, e a animação.
No interior da grande maioria dos Lares para idosos, a vida destes é bastante pobre no que respeita a acontecimentos de vida, pelo que uma das funções do psicólogo passará pela elaboração de programas de intervenção psicológica com o objectivo de melhorar a qualidade de vida dos idosos institucionalizados (Ribeiro e Felgueiras, 1995). A mesma qualidade de vida pode também ser melhorada se o psicólogo organizar actividades de animação social, no sentido de manter ou até mesmo melhorar as capacidades físicas e mentais do idoso.
Ao nível da animação social para idosos institucionalizados, podem ser desenvolvidos diversos tipos de actividades, como por exemplo exercício físico ligeiro, sessões de leitura de contos e poemas, visionamento de filmes e posterior discussão sobre os mesmos, sessões de discussão de temas propostos, actividades de trabalhos manuais como corte e colagem, bordados, rendas e tapeçaria, com posterior exposição dos trabalhos realizados, culinária, passeios ao ar livre, visitas a museus, idas ao teatro, passeios ao ar livre, etc.
Uma outra actividade que pode também ser desenvolvida são encontros de "Avós e Netos", que consiste na organização de sessões de convívio entre os idosos e crianças em idade escolar e/ou pré-escolar. No entanto, esta actividade depende do envolvimento da própria Instituição, no contacto com escolas da sua área, e da disponibilidade das mesmas para participar neste tipo de projecto, que tem outros aspectos, como por exemplo o transporte das crianças até ao Lar, ou, em alternativa, dos idosos até à escola.
O psicólogo deve também ter em atenção os idosos que se encontrem acamados na Instituição, e desenvolver algumas actividades em que os mesmos possam participar.
Esta não é uma tarefa fácil mas, por exemplo, pode ser elaborado um "Jornal da Instituição", com histórias, poemas, frases, ditados populares, anedotas e receitas, recolhidas junto dos idosos, acamados ou não. O jornal pode também ter um espaço destinado a uma breve apresentação de novos utentes das Instituição, datas de aniversário, calendário das actividades a desenvolver, sugestões, enfim…
Antes da passagem à prática das diversas actividades acima descritas, ou outras que se revelem adequadas à situação, é fundamental que seja realizada uma avaliação psicológica e física de cada um dos indivíduos, no sentido de perceber quais as capacidades reais de cada idoso relativamente a cada uma das actividades propostas.
Outro aspecto fundamental é o de que as actividades de animação devem ser realizadas com o maior número possível de participantes, pelo que se deve também fazer um estudo sobre quais as actividades que mais agradam aos utentes da Instituição e, logo, aquelas em que eles se sentem mais motivados a participar.
Um terceiro aspecto a considerar é a própria disponibilidade da Instituição, bem como se a mesma tem capacidade em termos de espaço físico para realização das actividades.
Como conclusão, reafirmo a importância da manutenção de alguma actividade nos idosos e o facto de as sugestões de actividades presentes neste texto serem apenas algumas das diversas actividades que podem vir a ser realizadas. Tudo depende do número de idosos, da sua capacidade física e psicológica, da imaginação e capacidade de adaptação do psicólogo, e também da própria Instituição.
Espero desta forma contribuir para a divulgação da importância da animação social nos Lares e Centros de Terceira Idade que, infelizmente, está muito pouco divulgada em Portugal. O ideal seria que, em cada Lar, existisse um psicólogo e um animador social, que trabalhassem, cada um na sua área de conhecimentos e em colaboração com toda a equipa multidisciplinar (Direcção, médico, enfermeiro, etc.) e com as próprias famílias dos idosos, no sentido de proporcionar uma vivência digna e de qualidade a todos os seus utentes, naquela que será, muito provavelmente, a sua última morada na sua passagem por esta vida…
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
Aiken, L. (1995). An Introduction to Gerontology, New York: Sage Publications, Inc.
Birouste, J. & Martineau, J. (?). Le Vieillissement, La Gérontologie et Les Psychologues. Bulletin de Psychologie, XLV(417), 648-663.
Farinha, A. (1995). Actividades de Terapia Ocupacional na Reabilitação. Hospitalidade, 232(4), 97-99.
Janela, E. (1995). Música, Teatro e Actividades Culturais como Factores de Reabilitação. Hospitalidade, 232(4), 100-102.
Morgenstern, D. (1992). Caregiving Interventions With the Elderly: Paths, Pains, Pitfalls and Possibilities. Psycotherapy in Private Practice, 11(4), 63-74.
Paúl, C. (1996). Psicologia dos Idosos: O Envelhecimento em Meios Urbanos. Braga: Sistemas Humanos e Organizacionais, Lda.
Ribeiro, J. & Felgueiras, S. (1995). Os Acontecimentos de Vida (Life Events) em Idosos Institucionalizados. In APPORT (Ed.), Áreas de Intervenção e Compromissos Sociais do Psicólogo (pp.54-59). Porto.
Faria Jr., A. (1997). Actividades Físicas para a Terceira Idade. Brasília.
Natacha Lage - Abril 2001
Artigo publicado no site https://www.tionline.pt
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ENVELHECER NA SOCIEDADE ACTUAL - IR OU NÃO PARA UM LAR DE IDOSOS?
As alterações sociais ocorridas nas últimas décadas trouxeram com elas algumas preocupações relativamente à população idosa, uma vez que levaram à criação de novos valores, atitudes e posições sociais que, de certa forma, entram em contradição com os valores e tradições dos membros mais idosos da nossa sociedade.
Os principais valores da sociedade actual e também os mais prioritários, são a produção, a rentabilidade, o consumismo e o lucro, face aos quais e de acordo com as actuais normas sociais, os indivíduos com 65 ou mais anos não têm possibilidades de competir, devido à obrigatoriedade de reforma aos 65 anos. A reforma é então um sinal da atitude estigmatizadora da actual sociedade face aos idosos, que são assim afastados do mercado de trabalho, o que faz com que muitos idosos se sintam inúteis; da mesma forma, a reforma leva também a uma diminuição do poder económico, o que tem como consequência a dependência do idoso relativamente aos seus familiares, que na maior parte dos casos são os seus filhos.
Por outro lado, há alterações no conceito de família provocadas por diversos factores, nomeadamente os processos migratórios e de emigração, a expansão urbana, e a emancipação da mulher e a sua consequente entrada no mercado de trabalho, que faz com que a mulher prefira assegurar primeiro o seu emprego e só depois pense em ser mãe, diminuindo assim o número de crianças por mulher em período de fecundidade.
Assim, assistimos ao desaparecimento das famílias alargadas, que são substituídas pelas famílias nucleares, compostas apenas por duas gerações (pais e filhos) e surgem também as famílias monoparentais; este facto leva a uma diminuição do número de elementos e à alteração de valores e tradições dentro da própria família. Esta diminuição do círculo familiar faz com que haja menos descendentes para tomarem conta dos anciãos e, por outro lado, menos crianças a necessitarem dos cuidados dos avós, pelo que o papel destes como principais prestadores de cuidados aos netos começa a desaparecer.
O facto de ambos os elementos do casal trabalharem fora de casa, na maior parte dos casos, faz com que não haja muita disponibilidade para a prestação de apoio aos idosos da família, principalmente a nível emocional.
Ao longo do processo de envelhecimento, as capacidades de adaptação do ser humano vão diminuindo, tornando-o cada vez mais sensível ao seu meio ambiente que, consoante as restrições implícitas ao funcionamento do idoso, pode ser um elemento facilitador ou um obstáculo para a sua vida. O bem-estar psicológico deste grupo etário está estreitamente associado à sua satisfação em relação ao seu ambiente residencial.
A casa de cada um adquire, para esse indivíduo, um significado psicológico único, uma vez que há laços afectivos que o ligam a esse espaço através de memórias do passado. O processo de apropriação, ligação e identidade do indivíduo à sua casa implica que a pessoa se aproprie do seu meio, porque o controla, cuida dele, torna-o familiar, criando um sistema de interacção entre si e o seu espaço/ambiente.
No caso dos idosos, porque normalmente já residem na sua casa há largos anos e porque os processos que ligam os indivíduos às suas casas se desenrolam e fortalecem ao longo do tempo, este é um espaço bastante importante, ao qual estão associados um conjunto de sentimentos que fazem com que o idoso esteja emocionalmente vinculado àquele lugar. Neste conjunto de sentimentos, encontramos:
- Os sentimentos associados às recordações do curso de vida do idoso, que o auxiliam a organizar e mentalizar esse percurso, de forma a que lhe seja possível manter "vivo" o seu passado, com um sentido de continuidade e de identidade, protegendo-se contra as transformações nocivas que vão ocorrendo.
- Um sentimento de auto-estima positiva, uma vez que o idoso, ao manter-se na sua casa, demonstra aos outros que ainda mantém a sua autonomia e independência.
O idosos está também fortemente ligado ao recheio da sua casa, que é um "depósito" de bens pessoais com grande valor sentimental e que levam o idoso a recordar acontecimentos, pessoas, épocas e locais que fizeram parte do seu percurso de vida, e que representam e mantêm a identidade pessoal e social do idoso.
Considerando o acima exposto, é fácil percebermos que a decisão de viver numa Instituição nunca é fácil, e não deve nunca ser tomada de ânimo leve ou apenas porque outros assim o querem. Existem variadíssimos motivos que podem levar o idoso a entrar para um Lar, como por exemplo problemas de incapacidade e/ou dependência física, falta de recursos económicos para manter a sua casa, viuvez, etc. Por outro lado, existem também situações em que é o próprio idoso que deseja ir para um Lar, como forma de garantir a segurança de um futuro previsto como difícil.
Diversos estudos realizados demonstram haverem dois tipos principais de resposta por parte dos idosos em resposta à sua entrada para um Lar - o surgimento de sintomas negativos nos estados físico e psicológico do idosos, acompanhados por um aumento das taxas de mortalidade ou, por outro lado, o desenvolvimento de resultados positivos, tais como o sentimento de pertença a um grupo, o desenvolvimento de novas amizades e as relações sociais.
Quando o idoso é confrontado com a sua institucionalização, ele tem de redefinir aquilo que é, podendo ficar deprimido - o idoso sofre uma deterioração psicológica, acompanhada por sentimentos de abandono por parte da família, mesmos que estes não sejam reais. A transição de um modo de vida independente para um modo de vida dependente -num lar- coloca em jogo a resistência de qualquer idoso, uma vez que implica a passagem de um ser autónomo e livre -residente na comunidade- para um ser institucionalizado, que tem de abdicar dos seus objectivos pessoais e adaptar-se a uma situação que gostaria de ter evitado.
Uma das actuais grandes problemáticas em relação aos idosos é, exactamente, a opção entre o isolamento dos idosos em ambientes protegidos com características institucionais, ou a criação e desenvolvimento de novas alternativas que permitam aos idosos envelhecer e morrer nos seus ambientes residenciais - apoio domiciliário, que deveria ser alargado a um período de sete dias por semana, 24 horas por dia (tal como já acontece em algumas instituições), centros de dia e de convívio com transporte, que permitam ao idoso que mora num local mais afastado ou que tem problemas de locomoção deslocar-se até lá para suprir as suas necessidades de convívio e outras, tais como a alimentação, instituições com valência de Lar mas que funcionem em regime de estada temporária, em que se o idoso tiver necessidade vai lá apenas passar uns dias, uma semana, um mês, mas depois volta para a sua casa, etc.…
Afinal, não será preferível manter o idoso em sua casa, onde ele tem tudo aquilo que o satisfaz, mantendo a sua autonomia, e integrando-o na sociedade, dando-lhe a possibilidade de poder contar com ajuda externa para tudo aquilo que ele próprio definir como necessário?
Natacha Lage - Junho 2001
Artigo publicado no site https://www.tionline.pt
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O MODELO RELACIONAL DIALÓGICO NA COMUNICAÇÃO FAMILIAR INTERGERACIONAL – UMA BREVE ABORDAGEM
Resumo:
Os padrões de comunicação utilizados pelas famílias não são, muitas vezes, os mais adequados para lidares com os seus idosos, integrando-os no agregado familiar. Assim, pretende-se com esta comunicação demonstrar de que forma a comunicação entre os vários membros de um agregado familiar intergeracional pode contribuir para a integração dos idosos nesse mesmo agregado, de acordo com o modelo relacional dialógico.
Devido a diversos factores de ordem social e económica, motivados pelo fenómeno da revolução industrial, a migração, a emigração, etc., o anterior conceito de família alargada, composta por vários elementos pertencentes a diversas gerações em convivio e coabitação na mesma residência, foi substituido pelo actual conceito de família nuclear, em que apenas duas gerações (pai, mãe e filho(s)) convivem e coabitam na mesma residência, encontrando-se os idosos a residir sozinhos e os adultos a fazer um forte investimento profissional, para garantirem a sua subsistência e a dos seus descendentes.
O conceito de “família” tem diversas definições, de acordo com diversos autores, variando até mesmo de acordo com o mesmo autor. Refiro aqui duas dessas definições, do mesmo autor, apenas para demonstrar a heterogeneidade deste conceito:
1. Família enquanto conjunto de parentes, vivos ou mortos, que partilham uma história, uma reputação, um património. (Segalen, 1999)
2. Família enquanto grupo de indivíduos que partilham o mesmo espaço residencial, unidos pelos laços do casamento e/ou filiação. (op. cit.)
Considerando o conceito formal de família enquanto um grupo de pessoas que partilham o mesmo espaço residencial, unidas pelos laços do casamento e/ou filiação, o actual conceito de família nuclear, e o que já foi dito relativamente ao facto de a nossa sociedade actual impor um forte ritmo de investimento profissional, compreende-se que os adultos de hoje enfrentem sérias dificuldades quando decidem acolher os seus idosos nas suas casas e, consequentemente, no seu agregado familiar. Não devemos também esquecer que cada um dos elementos que compõem o agregado familiar tem um determinado tipo de estrutura de personalidade, já definida, no caso dos adultos, ou ainda em formação, no caso das crianças e dos adolescentes, que vai condicionar a forma como cada um sente e gere as suas relações com os restantes membros do agregado familiar e com a sociedade em geral.
Sem entrar aqui na explicação e discussão dos diferentes tipos de estruturas de personalidade, gostaria de abordar algo que está na origem de todas essas estruturas e do modelo relacional-dialógico (da autoria de Maria Rita Mendes Leal, com base nas teorias de Freud, Sullivan, Winnicott, Bion, Melanie Klein e outros), e que é inato em todos nós; refiro-me aos padrões fixos de acção, descritos por J. S. Watson, em 1967. Estes padrões fixos de acção são observáveis, no ser humano, desde os primeiros dias após o nascimento, por exemplo, quando o bebé sorri, chora, emite um som, etc ., e aguarda que a mãe lhe dê uma resposta; de acordo com o modelo relacional dialógico, isto significa que o bebé toma uma iniciativa, e aguarda que a mãe lhe dê uma resposta a essa iniciativa, de preferência, adequada à mesma, ou seja uma resposta que, do ponto de vista psicofisiológico, seja contingente, que lhe dê prazer. Se tal acontecer, o bebé irá tomar uma nova iniciativa, ficando novamente à espera de uma resposta adequada da mãe a essa nova iniciativa, e assim por diante, assumindo aqui a mãe o papel de um cuidador válido, ou seja, que é capaz de dar respostas contingentes às iniciativas do bebé.
É esta continuidade de A-B / A’-B’ / A’’-B’’ que constitui o padrão fixo de acção para o ser humano definido por B. Watson. Se pensarmos um pouco, percebemos que há um tempo de latência, uma pausa, entre a iniciativa e a resposta à mesma; é esta pausa que determina o estabelecimento de um diálogo, de um intercurso relacional entre os intervenientes. (Leal, 1999)
O ser humano tem também a capacidade de analisar a contingência à própria iniciativa, ou seja, de reconhecer se a resposta que é dada à sua iniciativa é ou não adequada à mesma. Se o bebé, ao ter iniciativas, não obtiver resposta às mesmas, ou a resposta obtida não for adequada/contingente, ele irá ter cada vez menos iniciativas, até que, eventualmente, deixará de ter qualquer tipo de iniciativa, assim como o adolescente, o adulto, e os idosos. (Leal, 1997; 1999)
Ao transpormos isto para um determinado agregado familiar composto por três gerações (avós, pais e netos), temos que, do ponto de vista do idoso:
Na maior parte dos casos, numa estrutura familiar deste género, o que acontece é que o idoso, principalmente se já tiver um certo grau de dependência, passa o dia em casa, tendo muito poucos ou nenhuns contactos sociais; os adultos/filhos passam os dias nos empregos, onde convivem com os colegas de trabalho; e as crianças ou adolescentes/netos passam os dias na escola, onde convivem com os colegas e professores. Enquanto os adultos e as crianças passaram o dia no emprego ou na escola, onde satisfizeram as suas necessidades de convívio social, o idoso passou o dia em casa, sozinho... e tem necessidade de, também ele, satisfazer as suas necessidades de relação com os seus familiares, quando estes regressam a casa no final do dia.
Assim, quando os filhos ou netos chegam a casa, o idoso vai ter uma iniciativa, ou aguardar por uma iniciativa destes, por exemplo, perguntando ao filho como é que lhe correu o dia, e vai ficar à espera da resposta do filho a essa iniciativa, que pode ser adequada, inadequada, ou nem sequer existir; o idoso vai então analisar a resposta do filho à sua iniciativa, e consoante esta análise, e o prazer/desprazer que dela resultar, vai continuar a ter iniciativas ou não...
Obviamente, os vários tipos de comunicação utilizados pelas famílias são interiorizados durante anos, e são algo que não se consegue mudar repentinamente, mas depreende-se que, consoante haja ou não contingência de forma sistemática no seio da família, maior ou menor será o grau de satisfação e de integração dos vários elementos do agregado familiar – se um idoso, quando toma uma iniciativa em relação a um filho, neto, nora, genro, etc., obtiver, por norma, uma resposta adequada, que lhe dá prazer, ele sentir-se-á mais satisfeito e integrado na família, porque esta é contingente para com ele, mesmo que ocasionalmente receba uma resposta inadequada.
Mas como numa relação dialógica há o dar e há o receber, para que a família seja contingente para com o idoso, também este tem de ser contingente para com a família; um exemplo desta situação é o seguinte: a família combina ir dar um passeio, e integra o idoso nesta actividade, uma vez que ele faz parte da família; no entanto, o idoso rejeita esta ideia, alegando que tem dificuldades de locomoção; ao fazer isto, o idoso não está a dar uma resposta adequada à família, uma vez que esta já sabe que ele tem dificuldades de locomoção e mesmo assim inclui-o no passeio, porque a sua companhia seria uma fonte de prazer para a família; ao tomar este tipo de atitude por diversas vezes, o idoso está a dar respostas não contingentes de forma sistemática, o que fará com que, mais tarde, a família passe a planear os seus passeios e saídas sem incluir o idoso nas mesmas.
Um outro aspecto a considerar na convivência com idosos é o facto de que estes apresentam, na maior parte dos casos, uma lentificação/diminuição das suas capacidades, nomeadamente a nível cognitivo (Zimmerman, 2000), pelo que, em determinadas situações, necessitam de um período de latência um pouco mais longo para darem resposta às iniciativas dos outros, que, muitas vezes, por não terem conhecimento deste facto, entendem essa demora na resposta como uma não resposta; noutras situações, a resposta do idoso a determinadas iniciativas da parte dos outros pode não ser a mais adequada, também devido à diminuição e/ou lentificação das suas capacidades, o que deve sempre ser tido em conta quando se lida com idosos.
Conclusão:
Se considerarmos o convívio familiar intergeracional de acordo com o modelo relacional-dialógico, é possível perceber o porquê de tantos idosos, embora coabitando com as suas famílias, não se sentem como uma parte integrante das mesmas, sentindo-se sós, com uma fraca auto-estima, e quadros depressivos de maior ou menor intensidade – ao não se aperceber da necessidade que o idoso tem, como qualquer outro ser humano, de receber respostas contingentes às suas iniciativas, a família acaba por, muitas vezes sem se dar conta, votar o idoso ao isolamento, embora vivendo na mesma casa...
Referências Bibliográficas:
Leal, M. R. M. (1999). A Psicoterapia Como Aprendizagem – Um Processo Dinâmico de Transformações. Lisboa: Ed. Fim de Século.
Leal, M. R. M. (1997). A Grupanálise – Processo Dinâmico de Aprendizagem. Lisboa: Ed. Fim de Século.
Zimerman, G. (2000). Velhice – Aspectos Biopsicossociais. Porto Alegre: Artmed Ed.
Natacha Lage - Comunicação apresentada no III Seminário “A Idade Mayor”, a 22 de Março de 2003 (SCM Alvaiázere).
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Suporte Social: Quais os Seus Efeitos Sobre o Stress?
Resumo
Este estudo pretende avaliar os efeitos do suporte social sobre o stress, a nível emocional, em idosos residentes na comunidade, através do modelo amortecedor do stress. Coloca-se a hipótese da existência ou não de limites a partir dos quais o suporte social provoca um aumento do stress. A amostra é composta por 68 idosos de ambos os sexos, residentes na comunidade, e foi recolhida em três Centros de Dia da cidade de Lisboa. Para avaliar o suporte social utiliza-se uma escala criada por Krause (1995). Os resultados sugerem que embora o suporte emocional fornecido pelos familiares reduza o afecto deprimido, o mesmo não acontece quando o mesmo tipo de suporte é fornecidos pelos amigos.
O suporte social tem sido amplamente estudado nas duas últimas décadas, (Ornelas, 1994), ao longo das quais diversos investigadores de diversas ciências sociais e disciplinas relacionadas com a saúde têm dedicado especial atenção ao estudo das forças sociais que contribuem para a manutenção e promoção da saúde dos indivíduos (Cohen & Syme, 1985; Gottlieb, 1988). Estas investigações levaram ao surgimento de diversos instrumentos, que visam analisar a forma como as ligações humanas se estruturam em redes sociais de suporte e os recursos que são trocados entre os diversos indivíduos que compõem essas redes sociais de suporte (Gottlieb, 1988).
A relação entre o suporte social e o stress tem também sido largamente estudada, existindo resultados muito contraditórios nos diversos estudos publicados, o que deixa no ar a questão: Será que a relação entre o suporte social e o stress tem sido correctamente definida pelos investigadores? (Krause, 1987; 1995).
Tendo em conta o facto de a literatura relativa a esta área de investigação defender, na grande maioria dos casos, ideias e modelos muito simplificados da relação entre o suporte social e o stress, que defendem que o primeiro é sempre benéfico, não é de surpreender que esta mesma literatura contenha diversas conclusões contraditórias (Krause, 1995). Assim, tal como há quem defenda que a ajuda prestada pelos outros reduz o impacto nocivo do stress (Krause, 1986), também há quem afirme que o suporte social pode aumentar o impacto nocivo do mesmo (LaRoco & Jones, 1978).
Suporte Social
Uma das fontes de contribuição para o estudo do suporte social foram os trabalhos realizados na área do desenvolvimento infantil, nomeadamente a teoria de “attachment”, que permitiu que o suporte social fosse encarado como uma variável da personalidade que tem o seu início nas relações precoces do recém-nascido (Rook, 1984).
Na década de 60 ocorreram grandes modificações políticas e económicas, que deram também a sua contribuição para o estudo e investigação na área do suporte social; a Lei Kennedy, de 1963, veio realçar a importância dos relacionamentos sociais e do apoio familiar e dos amigos e vizinhos, em detrimento do apoio técnico e especializado (Sarason, Pierce & Sarason, 1990).
No entanto, o termo “sistema de suporte” foi introduzido por Caplan (cit. in Ornelas, 1994), a partir das formulações teóricas de John Cassel (1974) de forma a definir toda a rede de indivíduos e organizações de que um indivíduo pode dispôr – familiares, amigos, vizinhos e organizações prestadoras de serviços comunitários, tais como os clubes, associações de voluntários e os centros paroquiais, entre outros, englobando assim não só o suporte informal, mas também o formal e o comunitário, sendo que o primeiro é o que é prestado pela família, amigos e vizinhos, o segundo corresponde aos serviços prestados pelos técnicos, e o terceiro ao suporte prestado pelos serviços comunitários. O mesmo autor defende que este sistema de suporte pode prestar três tipos de actividades: o apoio na mobilização dos recursos psicológicos do indivíduo, a partilha de actividades e a ajuda material, que foram mais tarde definidos por Barrera (1981) como suporte emocional, “companheirismo” e suporte instrumental. Ainda de acordo com Caplan (cit. in Ornelas, 1994), o suporte prestado a um determinado indivíduo está relacionado com os suportes formal e informal que ele recebe, sendo a colaboração de ambos essencial para a compreensão das relações humanas e das suas necessidades sociais.
As formulações teóricas de Cassel (1974) no que respeita à implicação do ambiente social na origem e alívio do stress, e as estratégias práticas de Caplan (cit. in Ornelas, 1994) para a mobilização dos sistemas de suporte social foram alvo de grande atenção, e articularam, de forma clara, as implicações das investigações que tinham sido realizadas até aquele momento, em relação aos factores sócio-ecológicos e aos recursos informais de ajuda na saúde mental comunitária (Gottlieb, 1988).
Apesar dos avanços ocorridos na área do suporte social desde os primeiros trabalhos relativos a este tema, as definições continuam a ser bastante gerais, podendo mesmo pôr em perigo a “singularidade” do conceito, o que tem originado algumas críticas (Wortman & Conway, 1985). Outro factor a ter em linha de conta para estas críticas é o facto de os resultados obtidos pelos diversos estudos realizados não serem muito consistentes, devido à grande diversidade de abordagens na medição do suporte social (Rook, 1984). Assim, segundo Barrera (1986), para que se possa ultrapassar a questão da conceptualização e classificação do suporte social, é necessário colocar de lado as referências globais do mesmo, uma vez que estas são demasiado inespecíficas para serem utilizadas como conceitos de investigação.
Barrera (1986) formula então alguns modelos de suporte social, partindo das relações do mesmo com o stress e o distress:
a) Modelo de Mobilização do Suporte Social – O suporte social relaciona-se positivamente com os acontecimentos de vida stressantes, e negativamente com o distress.
b) Modelo de Prevenção do Stress – O suporte social previne o aparecimento de situações stressantes, ou diminui a probabilidade de essas situações serem percebidas pelo indivíduo como stressantes.
c) Modelo de deterioração do Stress – Os acontecimentos de vida stressantes estão negativamente relacionados com o suporte social, que por sua vez se relaciona também negativamente com o distress.
d) Modelo de Procura de Suporte – Há um relacionamento positivo entre o stress, os acontecimentos de vida e o suporte social recebido.
e) Modelo Aditivo do Stress – O stress e a integração social não estão interrelacionados, contribuindo independentemente para o bem-estar psicológico, o primeiro de forma positiva e a Segunda de forma negativa.
f) Modelo de Reciprocidade do Stress e do Suporte Social – Existe uma relação recíproca entre o suporte social percebido e os acontecimentos de vida stressantes.
Também Cohen (1988) desenvolveu alguns modelos de suporte social, partindo do pressuposto de que é possível afirmar que o suporte social influencia a mortalidade e a morbilidade dos indivíduos. Para este autor existem três grupos de modelos de suporte social:
a) Modelos Genéricos – O suporte social está relacionado com a doença através da sua influência sobre normas de conduta relativas ao estado de saúde do indivíduo, sobre as respostas biológicas, ou sobre ambas.
b) Modelos Centrados no Stress – Por um lado, o suporte social só é importante para indivíduos com baixos níveis de stress, mas por outro é benéfico, independentemente do nível de stress experienciado pelo indivíduo.
c) Modelos de Processos Psicossociais – Os efeitos do suporte social sobre a saúde são mediados por processos psicossociais. O modelo do efeito principal prediz a influência do suporte social sobre a saúde independentemente do nível de stress, enquanto que o modelo de amortecimento do stress defende que o suporte social tem efeitos positivos apenas quando os indivíduos se encontram em situações stressantes.
Segundo Dunkel-Schetter e Bennett (1990), é de referir que determinados tipos de suporte poderão ter efeitos (negativos ou positivos) diferentes, tendo em consideração a faceta comportamental ou a cognitiva. A título de exemplo, numa situação em que o indivíduo é monetariamente auxiliado por um membro da sua família, só o facto de ele realmente saber que este tipo de suporte está disponível pode ser benéfico, mas se ele receber mesmo esse apoio, este poderá ser negativo, uma vez que aumenta os sentimentos de dependência, que vão contra a sua procura de autonomia e independência.
Embora a maior parte dos autores defenda que o suporte social apenas tem efeitos positivos, outros defendem que também podem surgir efeitos negativos (Rios, Torres & Díaz, 1992). Assim, alguns dos efeitos positivos assinalados como resultando da existência de suporte social são a redução do stress, e o aumento da auto-estima e da auto-valorização dos indivíduos (op. cit.). Em relação aos efeitos negativos, há que ter em consideração que, por vezes, ao nível dos relacionamentos interpessoais do dia-a-dia, os indivíduos dizem ou fazem coisas que embora lhes pareçam positivas, no fundo são negativas para o indivíduo que necessita do seu suporte (op. cit.)
De acordo com os resultados de um estudo realizado por Brenner, Norvell e Limacher (1989), muitas fontes de interacções de suporte são ao mesmo tempo fonte de interacções problemáticas, pelo que, numa rede social, diversos relacionamentos parecem ser caracterizados por uma dualidade de acontecimentos positivos e negativos.
Segundo diversos autores, a relação entre os conceitos de suporte social e de redes sociais pode ser abordada a partir de duas perspectivas distintas: a primeira propõe que nem sempre é possível o estabelecimento de uma diferenciação entre eles, enquanto que a segunda propõe que estes dois conceitos são independentes, uma vez que embora se encare um sistema de suporte como parte de uma rede social, nem toda a rede social tem que ser, ou ter, necessariamente, um sistema de suporte (Cauce & Srebnik, 1990; Rios, Torres & Díaz, 1992; Wellman, 1988).
Por outro lado, House e Kahn (1985) chamam a atenção para o facto de que enquanto a rede social incide mais nos aspectos estruturais, tais como a densidade, dimensão e conexão, o suporte social enfatiza os aspectos funcionais das redes, ou seja, a prestação de serviços a nível instrumental, emocional, informativo, etc.
De acordo com La Gaipa (1990), diversos estudos têm demonstrado que o suporte e os laços sociais têm um importante papel a desempenhar na vida dos idosos, tanto a nível da saúde física, como a nível da prevenção de doenças psíquicas e da promoção do bem-estar geral.
Segundo Duck e Miell (1984), quando o prestador de suporte não tem experiência individual da situação em causa, ou quando o suporte é prestado numa altura inadequada, ele pode não produzir qualquer efeito. Nos idosos, é bastante frequente o prestador fornecer mais suporte do que o necessário, retirando a autonomia ao idoso, uma vez que se sente responsável por este, o que o leva a controlar a situação de forma excessiva e restringindo as decisões e interacções do idoso. Este excesso de apoio pode vir a ser problemático, pelo que deve ser evitado; o ambiente ideal para o idoso é aquele em que há uma proporção idêntica de suporte e desafio, que lhe propicie oportunidades de autonomia, que permitam que o idoso atinja os níveis máximos e toleráveis de competência, e que simultaneamente lhe ofereça suporte nas áreas em que o idoso não consegue ser autónomo.
Os primeiros estudos realizados em relação à noção de reciprocidade dos relacionamentos sociais dos idosos demonstraram que o que diferencia as relações dos idosos das relações dos mais jovens não é a idade, mas sim a natureza da relação em si. Através do estudo da forma como se processavam as trocas sociais em diversos tipos de relacionamentos, estes estudos demonstraram que os relacionamentos menos íntimos e mais superficiais utilizavam regras mais rígidas e restritas de trocas do que as que eram utilizadas em relacionamentos mais íntimos. Assim, numa relação mais superficial, algo que fosse fornecido por um dos elementos da díade era imediatamente retribuído por algo de valor equivalente, enquanto que num relacionamento mais íntimo e duradouro as trocas não têm que ser imediatas, e o seu valor não tem que ser exactamente equivalente; por outro lado, nas relações a curto prazo é mais característica a reciprocidade imediata, enquanto que nas relações a longo prazo esta reciprocidade não tem de ser imediata, instalando-se por vezes ao longo do tempo de duração do relacionamento (Antonucci & Jackson, 1990).
Este processo de trocas é explicado através da teoria do Banco de Suporte, cuja ideia corresponde, basicamente, ao funcionamento de um banco normal, onde existem diversos tipos de relação, de longo ou curto prazo, depositando o suporte recebido e retribuindo o suporte prestado. O banco é um sistema que possibilita aos indivíduos terem uma perspectiva a longo prazo de todas as suas trocas sociais. Quando um indivíduo atinge a velhice, ele tem cada vez mais dificuldades em prestar cuidados aos outros, pelo que ele passa a receber mais do que aquilo que dá; esta é uma situação bastante desagradável para qualquer indivíduo, uma vez que a relação deixa de ser recíproca. É então através do banco de suporte, ou melhor, através das reservas de suporte que o indivíduo tem que é possível manter a reciprocidade psicológica da relação. A teoria da reciprocidade defende também um aumento do tamanho da rede (op. cit).
Ao contrário do que é defendido pela teoria da reciprocidade, outros estudos defendem a estabilidade das redes de suporte ao longo da vida, que é explicada através do conceito de escolta (”convoy”) de suporte social. O conceito de escolta foi então introduzido para definir o conjunto de indivíduos que pertencem à rede social que acompanha um indivíduo ao longo da sua vida, e que é constituída pela família e amigos envolvendo o indivíduo e ajudando-o ao longo das diversas fases da vida. Antonucci e Kahn (cit. in Antonucci & Jackson, 1990) estabeleceram a imagem de escolta como um conjunto de três círculos concêntricos, cada um representando um determinado grau de intimidade com o indivíduo:
- No centro está o indivíduo em volta do qual se desenvolve a sua rede social.
- No círculo interior encontram-se os indivíduos que ultrapassam os requisitos necessários ao desempenho do seu papel, sendo estas as relações mais estáveis ao longo da vida.
- No círculo exterior inserem-se os indivíduos que, embora sendo suficientemente próximos e importantes da vida do sujeito para pertencerem à sua rede, só muito raramente ultrapassam os requisitos de desempenho.
Estas duas teorias sobre redes de suporte defendem o aumento ou a estabilidade das redes ao longo do processo de envelhecimento, mas não a sua diminuição, defendida por alguns outros autores, que afirmam que conforme aumentam as necessidades do idoso, há um desgaste da sua rede de suporte, uma vez que à medida que aumenta a incapacidade do idoso, a prestação de cuidados recai, geralmente, sobre um único elemento da rede (op.cit.).
Stress
De acordo com Chiriboga (1989), “stress” é um conceito vago, que tem sido definido e operacionalizado de diversas formas, sendo a principal em termos de acontecimentos de vida.
O stress é, muitas vezes, uma situação que exige uma adaptação do indivíduo, sendo uma resposta inespecífica do organismo às exigências que lhe são feitas pelo ambiente que o envolve. Ele manifesta-se normalmente através de uma sintomatologia diversa, incluindo tensão motora, hiperactividade autonómica, hipervigilância ou expectativa apreensiva; os sintomas reconhecidos pelo indivíduo são consequência de um processo em que as capacidades cognitivas internas e as exigências externas excedem a capacidade do indivíduo para lidar com elas, principalmente quando o indivíduo considera que essa exigência é importante para o seu bem-estar (Miller & Jay, 1989).
Desde a década de 1960 que a principal abordagem da relação entre o stress e a saúde física e mental tem tido como base o estudo dos acontecimentos de vida ocorridos num determinado espaço de tempo, partindo os investigadores do princípio de que esses acontecimentos de vida representam algum risco para a saúde do indivíduo a nível físico e/ou mental (Eckenrode & Gore, 1988). Este modelo dos acontecimentos de vida engloba algumas ideias, que de certa forma estão relacionadas entre si: 1) que a mudança em si é a única e principal propriedade que define a capacidade geradora de stress dos acontecimentos de vida, 2) que um dado acontecimento de vida requer a mesma capacidade de adaptação a diferentes indivíduos, e 3) que diferentes tipos de acontecimentos podem ser agrupados em categorias. O modelo teórico do stress que abarca estas ideias tem diversos aspectos importantes: o primeiro é que o stress é definido como uma exigência do ambiente sobre o organismo, estando os agentes stressantes totalmente desligados do indivíduo que os vivencia, o que leva a que as diferenças individuais que influenciam a capacidade stressante de acontecimentos específicos sejam ignoradas. Em segundo lugar, os processos sociais e/ou psicológicos em que poderiam ocorrer os acontecimentos stressantes e o surgimento de sintomas de doença (ou outros) não são tomados em conta neste tipo de investigações. Em terceiro lugar, apenas se analisa o stress a nível individual, deixando de lado as questões respeitantes à relação dos acontecimentos com estruturas e processos sociais mais amplos (Eckenrode & Gore, 1988).
Por outro lado, Rios, Torres e Díaz (1992) consideram o stress como sendo o resultado da importância que o indivíduo dá a uma situação, encarando-a como sendo stressante; a partir do momento em que uma situação é encarada como stressante, o indivíduo tem que confrontá-la, tendo este processo de confrontação duas funções básicas, uma delas centrada no problema e que consiste na sua manipulação ou alteração, e outra centrada na emoção, que tem a ver com a regulação da resposta emocional.
De acordo com McIntosh (1991), nos modelos de stress, o suporte social é tipicamente considerado, por diversos investigadores, como tendo efeitos directos e/ou moderadores, sendo que os primeiros actuam alterando a quantidade de stress que o indivíduo percebe numa determinada situação ou afectando directamente o bem-estar, enquanto que os segundos alteram a relação entre a percepção de um acontecimento potencialmente gerador de stress e o grau de tensão experimentado. A aceitação social provoca um aumento da auto-estima, o que leva a que o suporte social tenha um efeito directo sobre o bem-estar; por outro lado, os seus efeitos moderadores são consequência da interrupção de respostas fisiológicas prejudiciais às percepções dos agentes stressantes, ou da inibição de respostas comportamentais ameaçadoras da saúde aos agentes stressantes percebidos (op. cit).
Ainda de acordo com o mesmo autor, no que diz respeito à conceptualização dos efeitos moderadores do suporte social, existem dois tipos de abordagem: o primeiro é o efeito amortecedor, que diz que o suporte social não tem efeitos benéficos sobre a saúde entre indivíduos com um baixo nível de stress; o segundo é o efeito de coping do suporte social, que defende que os efeitos benéficos do suporte vão-se tornando progressivamente mais evidentes, de acordo com o aumento do suporte.
Krause (1989) defende que os indivíduos procuram de forma activa o auxílio dos outros, sempre que são confrontados com acontecimentos stressantes. Por outro lado, há quem afirme que os indivíduos, quando se encontram numa situação de stress, esforçam-se ao máximo para não se tornarem demasiado dependentes da sua rede social, só procurando a ajuda dos outros quando todos os seus recursos individuais se revelaram ineficazes (Eckenrode & Wethington, 1990). Também Barrera (1986) se pronunciou sobre esta questão, ao defender que indivíduos que se encontram em situações de stress têm maior tendência a procurar suporte social do que indivíduos que não se encontram em dificuldades.
Suporte Social, Stress e Terceira Idade
Tem também havido um constante interesse por parte dos gerontologistas em relação à forma como os relacionamentos sociais influenciam a saúde física e psíquica dos idosos. Assim, alguns investigadores questionaram se o envolvimento social informal poderia compensar as perdas de papel a que os idosos são particularmente vulneráveis, tais como a viuvez e a reforma obrigatória (Rook, 1990), e quais são os potenciais acontecimentos mais stressantes para um idoso, que já teve toda uma vida de experiências em alteração (Stein, Linn, Slater & Stein, 1989).
Mais recentemente surgiram também alguns trabalhos cuja temática é o papel do suporte social para uma melhor adaptação dos idosos a eventos stressantes (Krause, 1986; Cutrona, Russell & Rose, 1986; Krause, 1987).
Diversos investigadores têm observado que a relação entre os acontecimentos de vida stressantes e o bem-estar psicológico é fraca, sendo necessária uma melhor compreensão da forma como o stress influencia o bem-estar (Kasl, 1983).
A hipótese do suporte social como amortecedor do stress surgiu dentro deste contexto como a mais aceite elaboração teórica sobre o processo do stress. Essencialmente, esta hipótese defende que indivíduos com fortes sistemas de suporte social têm menos probabilidades de sofrer com os efeitos nocivos do stress do que os indivíduos com redes de suporte mais fracas. Alguns estudos revelam que o suporte social reduz os efeitos do stress sobre o bem-estar, embora outros não tenham encontrados efeito significativos (Krause, 1987).
O outro lado da hipótese amortecedora do suporte social sobre o stress, ou seja, que os relacionamentos sociais de suporte podem potenciar os acontecimentos stressantes raramente tem sido considerada. Uma vez que muito poucos estudos têm sido realizados nesta área, não é possível concluir se os indivíduos que têm níveis de suporte reduzido estão geralmente isolados, ou seja, têm redes de suporte nulas ou pouco significantes, ou se, por outro lado, não se encontram isolados, mas têm predominância de laços sociais perturbadores. Embora os indivíduos aparentem ter contactos sociais na sua maioria positivos, é possível colocar a hipótese de que alguns contactos sejam indesejados e de natureza aversiva (Rook, 1984).
McIntosh (1991) defende a ideia de que, quando o indivíduo se encontra na presença de um agente stressante de natureza crónica, níveis moderados de suporte são mais úteis do que níveis elevados, sendo a adequabilidade do suporte a única propriedade do suporte social que se relaciona de forma significativa com o nível de stress experimentado pelos indivíduos.
Por sua vez, Cutrona, Russell e Rose (1986) não encontraram nada que indique que indivíduos com altos níveis de suporte se deparam com menos acontecimentos de vida stressantes.
Tendo em atenção os estudos de Antonucci e Kahn (cit. in Antonucci & Jackson, 1990) relativamente à estabilidade das redes sociais, nomeadamente o modelo de escolta e também o estudo de Cutrona, Russell e Rose (1986), parece-nos então pertinente a avaliação dos efeitos amortecedores do suporte social sobre o stress. Assim, o objectivo deste estudo, de carácter exploratório, correlacional e transversal, é a avaliação dos efeitos amortecedores do suporte social sobre o stress, a nível emocional, em idosos residentes na comunidade, colocando-se a hipótese de que o suporte social, com um excesso de suporte emocional, provoca um aumento do stress. Pretende-se também fazer a validação da escala utilizada para a população portuguesa.
MÉTODO
Amostra
A tabela 1 indica a caracterização da amostra segundo o sexo, estado civil, e composição do agregado familiar. A amostra é composta por 68 indivíduos, de ambos os sexos, com idades compreendidas entre os 65 e os 94 anos de idade, residentes na comunidade, e inscritos em 3 Centros de Dia para a Terceira Idade, da área metropolitana da cidade de Lisboa, sendo que dois deles pertencem à Santa Casa da Misericórdia de Lisboa, e o terceiro a uma Instituição Particular de Solidariedade Social. A média etária dos indivíduos é de 77 anos, com um desvio padrão de 6, e, do total de indivíduos, 15 são do sexo masculino (22,06%), e 53 são do sexo feminino (77,94%).
Em relação ao estado civil, a grande maioria dos indivíduos são viúvos (31, o que corresponde a 45,59% do total da amostra), enquanto que 15 indivíduos são casados (22,06%).
Relativamente ao agregado familiar, 36 indivíduos vivem sós (52,94%), 25 vivem acompanhados por uma pessoa (36,76%), e os restantes indivíduos têm agregados familiares compostos por 2 a 5 elementos.
A nível da actividade profissional, 17 indivíduos (25,00%) eram funcionários de limpeza e 15 (22,06%) eram domésticos, dividindo-se os restantes por diversas outras actividades.
O tempo de frequência do Centro de Dia varia entre 1 e 35 anos, sendo a média de 7 anos, com um desvio padrão de 6. Relativamente à frequência semanal do Centro de Dia, esta varia entre 1 e 5 vezes por semana, sendo a média de 4 vezes, com um desvio padrão de 1, sendo que 44 indivíduos (64,71%) apenas frequentam os Centros de Dia durante o período da tarde, enquanto que 24 (35,69%) o fazem durante todo o dia.
Instrumento
O instrumento a utilizar no presente estudo será uma adaptação da escala apresentada por Krause em 1995, que avalia os sintomas depressivos e o suporte emocional.
Os sintomas depressivos, que constituem a variável independente deste estudo, são avaliados nesta escala através de 7 itens retirados da Escala para a Depressão do Centro de Estudos Epidemiológicos (CES-D: Radloff, 1977). A análise factorial confirmatória efectuada demonstrou que estes 7 itens avaliam duas dimensões diferentes: a primeira, referente ao afecto deprimido, avalia os aspectos cognitivo-afectivos da depressão, tais como o sentir-se triste, aborrecido e deprimido; a segunda dimensão avalia as manifestações fisiológicas da tensão psicológica, como as dificuldades do sono e a falta de energia. Com base nestes dados, os 7 itens foram divididos em dois subtítulos - Afecto Deprimido e Sintomas Somáticos -, sendo que uma pontuação elevada em qualquer um deles indica uma maior tensão psicológica. A fidedignidade destes dois grupos de itens é aceitável, sendo os resultados da análise factorial confirmatória de .84 para o Afecto Deprimido e de .74 para os Sintomas Somáticos.
O Suporte emocional é avaliado nesta escala através de 4 itens retirados do trabalho de Krause e Markides (1990), que avaliam a frequência com que os idosos receberam suporte emocional dos Outros Significativos durante o ano anterior à entrevista, Quanto maior for a pontuação obtida nestes itens, maior foi o suporte emocional recebido. A análise factorial confirmatória destes itens foi de .83.
O score de cada item é feito através de uma escala de tipo Likert, em que o indivíduo tem quatro hipóteses de resposta, cotadas, respectivamente, com 1, 2 3 ou 4 pontos: raramente/nunca, poucas vezes, ocasionalmente, ou quase sempre/sempre.
Procedimento
A amostra foi recolhida através de entrevistas individuais em gabinete fechado, com uma duração média de cerca de 20 minutos cada uma, entre os dias 17 de Março e 22 de Abril de 1998, todas elas realizadas entre a hora do almoço e a hora do lanche. Foi primeiramente feita uma apresentação geral do que era pretendido e de qual o objectivo do estudo a todos os indivíduos que se encontravam nas salas de convívio dos três Centros de Dia pela Directora dos mesmos; em seguida, foi feita uma abordagem individual a cada um dos indivíduos, explicando novamente o objectivo do estudo e em que se sentido se pretendia a sua colaboração; todos os indivíduos que aceitaram participar foram então encaminhados para o gabinete, onde se realizou a aplicação do instrumento.
RESULTADOS
Chegámos a uma solução factorial de componentes principais com rotação varimax e, aplicada a regra de Kaiser (valores próprios com valores 1.00 e saturação dos itens no factor .40), foram encontrados dois factores, sendo que a estrutura surgida explica 72.47% da variância total. Em relação ao primeiro factor (afecto deprimido), a estrutura encontrada explica, só por si, 47.41% da variância, enquanto que o segundo factor (suporte emocional) explica 25.06% da variância. Verificámos que foi replicada na íntegra a subescala respeitante ao afecto deprimido; no que diz respeito à subescala dos sintomas somáticos, não foi encontrado nenhum item que replicasse o original, uma vez que todos os itens correspondentes a este factor se encontram misturados com o factor 1 (afecto deprimido). Relativamente ao segundo factor (suporte emocional), foram replicados três itens do original, sendo que o quarto item não atingiu o nível de saturação mínima exigida. Os valores de saturação dos itens variam entre .54 e .90.
No presente estudo foram encontrados valores de consistência interna de .92 para o afecto deprimido e .83 para o suporte emocional, o que revela uma boa consistência interna. Relativamente ao estudo original, o valor encontrado para o afecto deprimido é superior ao do original, enquanto que a nível do suporte emocional o valor é idêntico.
Neste estudo, o valor médio do afecto deprimido é de 17.93 com um desvio padrão de 7.42; No que diz respeito ao suporte emocional, o valor médio é de 7.44, e o desvio padrão de 3.20.
A associação entre o suporte emocional e a dimensão do agregado familiar é directa e estatisticamente significativa, o que significa que quanto maior é o agregado familiar, maior é o suporte emocional (r = .29; p .050). Foi encontrada uma associação inversa estatisticamente significativa entre o suporte emocional e o afecto deprimido, ou seja, quanto maior é o suporte emocional, menor é o afecto deprimido (r = -.39; p .001). Relativamente à associação entre o afecto deprimido e a frequência semanal de Centro de Dia, esta é directa e estatisticamente significativa, sendo que quanto mais vezes por semana os indivíduos vão ao Centro de Dia, maior é o seu afecto deprimido (r = .27; p .050). Finalmente, no que diz respeito à associação entre o afecto deprimido e o período do dia em que os indivíduos se encontram no Centro de Dia, esta é directa e estatisticamente significativa, o que significa que quanto mais tempo os indivíduos passam no Centro de Dia, maior é o seu afecto deprimido (r =- .28; p .050).
A figura 1 apresenta o modelo preditor do suporte emocional encontrado neste estudo, segundo o qual quanto maior é o afecto deprimido menor é o suporte emocional. Também a composição do agregado familiar está relacionada com o suporte emocional, sendo que quanto maior é o número de indivíduos que habitam com o sujeito, maior é o seu suporte emocional.
A figura 2 apresenta o modelo preditor do afecto deprimido, sendo possível verificar que os indivíduos do sexo feminino apresentam uma maior percentagem de afecto deprimido, e também que quanto maior é a frequência semanal do Centro de Dia, maior é o afecto deprimido Neste modelo observa-se ainda que quanto maior é o suporte emocional menor é o afecto deprimido.
Observando os dois modelos encontrados, verifica-se que existe uma estreita interdependência entre os dois constructos, suporte emocional e afecto deprimido, estando a associação entre eles presente em ambos os modelos e sendo, em ambos os casos, inversa e estatisticamente significativa. Assim, não é possível neste estudo concluir se é o suporte social que prediz o afecto deprimido ou se, pelo contrário, é o afecto deprimido que prediz o suporte social. Ou seja, qual deles está na génese do outro.
DISCUSSÃO
Os dois objectivos deste estudo eram a validação da escala utilizada, e a avaliação dos efeitos amortecedores do suporte social sobre o stress, a nível emocional, em idosos residentes na comunidade.
No que respeita à validação da escala apresentada por Krause (1995), não foi conseguida a replicação total da mesma, sendo que um dos itens foi retirado por não atingir a saturação mínima exigida; os itens referentes à subescala dos sintomas somáticos encontram-se misturados com os itens respeitantes à subescala afecto deprimido, Assim, encontrámos uma escala composta por dez itens e duas subescalas, sendo que os sete primeiros itens correspondem à subescala afecto deprimido e os três últimos à subescala suporte emocional. Esta estrutura explica mais de 72% da variância. A escala encontrada apresenta uma boa consistência interna, com valores da alfa de Cronbach superiores a .80.
Segundo o modelo preditor do afecto deprimido encontrado neste estudo, há uma associação directa estatisticamente significativa entre a frequência semanal do Centro de Dia e o afecto deprimido, o que significa que quanto maior é o contacto com os restantes frequentadores do Centro de Dia maior é o afecto deprimido do indivíduo em questão; Também Fiore, Coppel, Becker e Cox (1986) defendem que o facto de os indivíduos terem um maior contacto com a sua rede social não significa que eles estejam satisfeitos com a sua rede, nem que esta contribua para o seu bem-estar psicológico. Este modelo revela também que os indivíduos do sexo feminino apresentam um maior afecto deprimido, o que é consistente com os resultados apresentados por Dohrenwend e Dohrenwend (1981); no entanto, muitos outros estudos sugerem que o sexo é irrelevante relativamente aos efeitos do suporte social no bem-estar psicológico dos indivíduos (Vaux, 1988).
Os resultados obtidos permitem-nos concluir que, mais importante do que a quantidade de suporte emocional recebida, é a qualidade desse tipo de suporte, uma vez que embora tenhamos verificado, através do modelo preditor do afecto deprimido encontrado neste estudo, que quanto maior é o suporte social menor é o afecto deprimido, ao tentarmos perceber qual a fonte de suporte social deparámo-nos com o facto de que se por um lado, quanto maior é o suporte emocional fornecido pelos familiares menor é o afecto deprimido, por outro lado, quanto maior é o suporte emocional fornecido pelos amigos maior é o afecto deprimido, o que vai de encontro ao que afirmaram Felton e Berry (1992), que defenderam que mesmo quando parentes e não parentes fornecem o mesmo tipo de suporte social, as consequências psicológicas para o idoso diferem de acordo com a fonte. Também Rook (1984) afirmou que amigos e familiares fornecem diferentes tipos de suporte.
A nossa hipótese é então parcialmente confirmada pelos resultados obtidos, no sentido de que um maior suporte emocional fornecido pelos amigos não diminui o afecto deprimido, mas o inverso acontece quando esse mesmo suporte é fornecido pelos familiares.
O facto de os dados utilizados para este estudo terem sido recolhidos num só momento não nos permite determinar se o stress ou o suporte social desempenham um papel determinante na génese do afecto deprimido, ou se este influencia a quantidade e qualidade dos acontecimentos stressantes com que os idosos se deparam; Barrera (1986) afirma que níveis mais elevados de suporte social podem estar associados a um maior afecto deprimido, uma vez que os indivíduos deprimidos poderão receber uma maior assistência por parte dos outros significativos com o objectivo de os ajudar a lidar com os seus problemas de saúde mental.
Infelizmente, os resultados deste estudo não podem ser generalizados, uma vez que a amostra se limita a três Centros de Dia da área metropolitana da cidade de Lisboa. Parece-nos no entanto que seria pertinente a realização de um estudo mais abrangente a este nível.
Futuros estudos poderão abordar não só a dimensão mas também a estrutura das redes sociais de suporte, nomeadamente a nível das fontes de suporte social emocional e instrumental, e a sua relação não só com o stress e a saúde mental como com a qualidade de vida dos idosos.
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Natacha Lage
Monografia de Final de Curso, Julho 1998
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Síndrome de Asperger
Resumo
A incessante procura de conhecer o ser humano, leva a uma procura por parte dos cientistas a necessidade de descobrir o processo psicológico do próprio Homem. A Síndrome de Asperger é uma desordem pouco comum, contudo importante na prevenção do processo psicológico de crianças, que tardiamente é diagnosticado devido à falta de conhecimento por parte dos profissionais, nomeadamente dos professores e educadores. Esta síndrome é uma categoria bastante recente na divulgação científica e encontra-se em uso geral nos últimos 15 anos. Este trabalho visa alguma informação acerca desta síndrome, visto que já por várias vezes foi confundida com uma Perturbação Obsessivo – Compulsiva, Depressão, Esquizofrenia, etc. Porém, não apresentam qualquer atraso significativo de desenvolvimento de fala ou cognitivo, podendo até mesmo passar a vida toda sendo apenas consideradas pessoas “estranhas” para os padrões típicos de comportamento. Embora essas pessoas não tenham um atraso significativo no desenvolvimento cognitivo, é importante que a criança receba educação especializada o mais cedo possível para auxiliar o indivíduo a contornar os problemas de comportamento que apresenta e também para ajudar a direccionar os campos de interesse e de estudo da criança.
A Síndrome de Asperger é o nome dado a um grupo de problemas que algumas crianças (e adultos) têm quando tentam comunicar com outras pessoas.
Esta Síndrome foi identificada em 1944, mas só foi oficialmente reconhecido como critério de diagnóstico no DSM-IV em 1994. Como resultado, muitas crianças foram mal diagnosticadas com síndromes como Autismo, Perturbação Obsessivo – Compulsivo, etc.
Ao longo dos tempos muitos foram os termos utilizados para definir esta síndrome, gerando grande confusão entre pais e educadores. Síndrome de Asperger é o termo aplicado ao mais suave e de alta funcionalidade daquilo que é conhecido como o espectro de desordens pervasivas (presentes e perceptíveis a todo o tempo) de desenvolvimento (espectro do Autismo).
Esta síndrome parece representar uma desordem neurobiológica que é muitas vezes classificada como uma Pervasive Developmental Disorders (PDD). É caracterizada por desvios e anormalidades em três amplos aspectos do desenvolvimento: interacção social, uso da linguagem para a comunicação e certas características repetitivas ou perserverativas sobre um número limitado, porém intenso, de interesses.
Apesar de existirem algumas semelhanças com o Autismo, as pessoas com Síndrome de Asperger geralmente têm elevadas habilidades cognitivas (pelo menos Q.I. normal, às vezes indo até às faixas mais altas) e por funções de linguagem normais, se comparadas a outras desordenas ao longo do espectro.
Apesar de poderem ter um extremo comando da linguagem e vocabulário elaborado, estão incapacitadas de o usar em contexto social e geralmente têm um tom monocórdico, com alguma nuance e inflexão na voz.
Crianças com Síndrome de Asperger, podem ou não procurar uma interacção social, mas têm sempre dificuldades em interpretar e aprender as capacidades da interacção social e emocional com os outros.
Hosbon (1995), postulou que crianças com SA têm incapacidade para interagir emocionalmente com os outros, portanto a criança com Autismo não recebe as experiências sociais necessárias para desenvolver as estruturas cognitivas para a compreensão.
Baron – Cohen e colegas (1993), indicam que as primeiras experiências são as cognitivas. As teorias destes autores sobre a mente é baseada na ideia de que as crianças com Autismo falham no desenvolvimento da compreensão de que a mente e o estado mental ralata o comportamento.
Tager – Flusberg (1993), indicam que crianças com Autismo não desenvolvem uma compreensão de que a linguagem e comunicação existe para troca de informação.
Muitos pesquisadores acham que há duas áreas de relativa intensidade que distinguem as SA (Síndrome de Asperger) de outras formas de Autismo e PDD e concorrem para um melhor prognóstico em SA. Não chegaram a consenso se existe alguma diferença entre as SA e o Autismo de Alta Funcionalidade (AAF). Alguns pesquisadores sugerem que o deficit neuropsicológico básico é diferente para as duas condições, mas outros não estão convencidos de que alguma distinção significativa possa ser feita entre os dois. (Bauer, 1995)
Epidemiologia
Os melhores estudos que têm sido conduzidos até agora sugerem que SA é consideravelmente mais comum que o Autismo clássico. Enquanto que o Autismo tem tradicionalmente sido encontrado à taxa de 4 a cada 10.000 crianças, estima-se que a Síndrome de Asperger esteja na faixa de 20 a 25 por 10.000. isto significa que para cada caso de Autismo, as escolas devem esperar encontrar diversas crianças com o quadro SA. (Bauer, 1995)
Todos os estudos concordam que a Síndrome de Asperger é muito mais comum em rapazes que em raparigas. A razão para isso é desconhecida. SA é muito comummente associada com outros tipos de diagnóstico, novamente por razões desconhecidas, incluindo: “tics” como a desordem de Tourette, problemas de atenção e de humor como a depressão e ansiedade. Em alguns casos há um claro componente genético, onde um dos pais (normalmente o pai) mostra ou o quadro SA completo ou pelo menos alguns traços associados ao SA; factores genéticos parecem ser mais comuns em SA do que no Autismo clássico. (idem)
Contudo uma coisa é certa, SA não é causada pela má educação dos pais ou problemas de família! Infelizmente muitos pais sentem-se culpados por uma desordem neurobiológica que não é culpa deles.
Definição
O novo critério do DSM-IV para diagnóstico de SA, inclui a presença de:
Particularidades qualitativas na interacção social, envolvendo alguns ou todos de entre:
uso de peculiaridade no comportamento não-verbal para regular a interacção social;
falha no desenvolvimento de relações com pares da sua idade;
falta de interesse espontâneo em dividir experiências com outros;
falta de reciprocidade emocional e social.
Padrões restritos, repetitivos e estereotipados de comportamento, interesses e actividades envolvendo:
preocupação com um ou mais padrões de interesse restritos e estereotipados;
inflexibilidade a rotinas e rituais não funcionais específicos;
maneirismos motores estereotipados ou repetitivos, ou preocupação com partes de objectos.
De acordo com o DSM-IV os critérios para se poder diagnosticar a Síndrome de Asperger são:
Critérios Diagnósticos para F84.5 - 299.80 Transtorno de Asperger
A. Prejuízo qualitativo na interacção social, manifestado por pelo menos dois dos seguintes quesitos:
(1) prejuízo acentuado no uso de múltiplos comportamentos não-verbais, tais como contacto visual directo, expressão facial, posturas corporais e gestos para regular a interacção social
(2) fracasso para desenvolver relacionamentos apropriados ao nível de desenvolvimento com seus pares
(3) ausência de tentativa espontânea de compartilhar prazer, interesses ou realizações com outras pessoas (por ex., deixar de mostrar, trazer ou apontar objectos de interesse a outras pessoas)
(4) falta de reciprocidade social ou emocional
B. Padrões restritos, repetitivos e estereotipados de comportamento, interesses e actividades, manifestados por pelo menos um dos seguintes quesitos:
(1) insistente preocupação com um ou mais padrões estereotipados e restritos de interesses, anormal em intensidade ou foco
(2) adesão aparentemente inflexível a rotinas e rituais específicos e não funcionais
(3) maneirismos motores estereotipados e repetitivos (por ex., dar pancadinhas ou torcer as mãos ou os dedos, ou movimentos complexos de todo o corpo)
(4) insistente preocupação com partes de objectos
C. A perturbação causa prejuízo clinicamente significativo nas áreas social e ocupacional ou outras áreas importantes de funcionamento.
D. Não existe um atraso geral clinicamente significativo na linguagem (por ex., palavras isoladas são usadas aos 2 anos, frases comunicativas são usadas aos 3 anos).
E. Não existe um atraso clinicamente significativo no desenvolvimento cognitivo ou no desenvolvimento de habilidades de auto-ajuda apropriadas à idade, comportamento adaptativo (outro que não na interacção social) e curiosidade acerca do ambiente na infância.
F. Não são satisfeitos os critérios para um outro Transtorno Invasivo do Desenvolvimento ou Esquizofrenia.
Cristopher Gillberg, propõe seis critérios, sendo apenas aqui referidos cinco, para o diagnóstico que capturam o estilo único dessas crianças e que incluem:
Isolamento social, com extremo egocentrismo, que pode incluir:
falta de habilidades para interagir com os pares;
apreciação pobre da trança social;
respostas socialmente inapropriadas.
Há interesses e preocupações limitadas:
mais rotinas que memorizações;
relativa exclusividade de interesses.
Há rotinas e rituais que podem ser:
auto-impostos;
impostos por outros.
Há problemas na comunicação não-verbal como:
uso limitado de gestos;
linguagem corporal desajeitada;
expressões faciais limitadas ou impróprias
olhar fixo peculiar;
dificuldades de ajuste a proximidade física.
O mais óbvio marco da Síndrome de Asperger e a característica que faz dessas crianças tão únicas e fascinantes, é a sua peculiar idiossincrática área de “interesse especial”. Em contraste com o mais típico Autismo, onde os interesses são mais para objectos ou parte de objectos, na SA os interesses são mais frequentes por áreas intelectuais específicas. (Bauer, 1995)
Quando as crianças entram para a escola, ou mesmo antes, elas mostrarão interesse obsessivo numa determinada área como a matemática, aspectos de ciência, leitura (alguns têm histórico de hipelexia – leitura rotineira em idade precoce) ou algum aspecto de história ou geografia, querendo aprender tudo quanto for possível sobre o objecto e tendendo a insistir nisso em conversas e jogos livres. (Idem)
Voltando à descrição de Hans Asperger em 1944, a área de transportes tem parecido ser de especial atenção.
Embora os sintomas comportamentais do Síndrome de Asperger sejam bem estabelecidos, muito pouco é sabido sobre as raízes neurobiológicas da desordem. Alguns estudos mostraram que os povos diagnosticados com Autismo têm anormalidades nos lobos frontais e parietais.
Os investigadores usaram uma técnica chamada ressonância magnética por emissão de protões (ou " 1 H-Sra.", porque " 1 H" é o símbolo químico para um protão). Este método mede a concentração metabólica do cérebro (da "ruptura produtos para baixo") envolvidos na produção de energia. A concentração de medição do metabolismo dá aos investigadores um retrato total do estado dos neurónios numa área particular do cérebro.
Uma outra característica de SA é a deficiente socialização e isso também tende a ser algo diferente do que se vê no Autismo. Embora crianças com SA sejam frequentemente conotadas pelos pais e professores como “estando no seu próprio mundo”, elas raramente são distantes como as crianças com Autismo. (Bauer, 1995)
Em geral, a proporção de casos de Autismo atribuíveis a afecções clínicas específicas é relativamente baixa. A relação, particularmente uma relação causal, de outras afecções clínicas com o Autismo é complexa. Muitas vezes, os relatos iniciais de tais associações baseiam-se em relatos de casos, e não em estudos controlados ou em amostras com base epidemiológica. Por exemplo, a impressão de uma forte relação entre Autismo e rubéola congénita teve de ser modificada quando se tornou aparente que tais casos tendiam a tornar-se menos semelhantes ao Autismo com o passar do tempo e que pelo menos uma parte dessa semelhança estava relacionada ao comprometimento sensorial e à severa deficiência mental exibida. In neuro Psico News, 2000
Para estudos de afecções clínicas associadas ao Autismo, a pergunta crítica não é se já foram observadas associações, mas se a associação é maior do que seria de se esperar, dada a taxa do transtorno na população geral. As taxas de afecções clínicas relatadas que poderiam relacionar-se casualmente com o Autismo têm variado amplamente, dependendo de vários factores. (Idem)
Gillberg e Coleman (1996) relataram taxas de tais afecções clínicas que se aproximam de 25%, enquanto Rutter e colegas (1994) sugerem que 10% é uma percentagem mais representativa. Os dados não parecem sugerir mais que associações casuais do Autismo com Síndrome de Down, a rubéola congénita, a paralisia cerebral, a fenilcetonúria e a neurofibromatose. (Idem)
Por outro lado, tanto a Síndrome do X frágil quanto a esclesose tuberosa ocorrem em pessoas com Autismo, em taxas mais altas do que seria de esperar numa base casual. Aproximadamente uma em 100 pessoas com Autismo exibe a anomalia do X frágil. A taxa de Autismo na esclerose tuberosa também é elevada. (Idem)
Crianças com deficiências congénitas (como cegueira ou surdez) podem apresentar uma questão de possível Autismo em virtude de movimentos não comuns ou dificuldades de linguagem, mas geralmente não são preenchidos os requisitos completos para o Autismo. (Idem)
Os estudos post-mortem em pessoas com Autismo demonstraram uma forte evidência de patologia no cérebro. Tomografia Axial Computorizada e Ressonância Magnética mostraram certas anormalidades no córtex cerebral, cerebelo e nos ventrículos do cérebro. Contudo, essas anormalidades não são consistentes. Estudos de neuroimagem, tal como, Positron Emission Tomography (PET) e Single Photon Emission Tomography (SPECT) também não demonstraram qualquer anormalidade. Provavelmente, a anormalidade é muito subtil para ser projectada através das técnicas de investigação correntemente aplicáveis.
Tratamento
Devido ao facto de a Síndrome de Asperger ser relativamente recente no desenvolvimento da Psicologia e Psiquiatria, muitas das abordagens ainda estão em fase inicial e muito trabalho ainda necessita de ser feito nesta área.
É óbvio para todos, que quanto mais cedo o tratamento começar, melhor será a sua recuperação. Isto implica tratamento a nível psicoterapeutico, a nível educacional e social.
O Treino de Competências Sociais é um dos mais importantes componentes do programa de tratamento. Crianças com esta síndrome podem ser ajudadas na aprendizagem social através de psicólogos preparados. A linguagem corporal e a comunicação não-verbal podem ser ensinadas da mesma maneira que se ensina uma língua estrangeira.
As crianças conseguem aprender a como interpretar expressões não-verbais, emoções e interacções sócias. Este procedimento assiste-as nas interacções sociais e aproximações com as pessoas, prevenindo assim o isolamento e depressão que geralmente ocorre assim que entram na adolescência.
Os adolescentes podem, algumas vezes, receber benefícios através do grupo terapêutico e podem ser ensinados a usar a mesma linguagem que as pessoas da sua idade.
Porque as crianças com SA podem-se diferenciar em termos de Q.I. e níveis de habilidades, as escolas ter programas individualizados para essas crianças. Os professores devem estar atentos às necessidades especiais que estas crianças precisam, o que geralmente não acontece, pois elas precisam de maior apoio que as restantes crianças.
O mais importante ponto de partida para ajudar os estudantes com SA a funcionar efectivamente na escola é que o staff (todos que tenham contacto com a criança) compreenda que a criança tem uma desordem de desenvolvimento que a leva a comportar-se e a responder de forma diferente dos demais estudantes. Muito frequentemente, o comportamento dessas crianças é interpretado como “emocional” ou “manipulativo” ou alguns termos que confunde a forma como eles respondem diferentemente ao mundo e seus estímulos. Dessa compreensão segue que o staff da escola precisa individualizar a sua abordagem para cada uma dessas crianças; não funciona tratá-los da mesma forma que os outros estudantes. (Bauer, 1995)
O próprio Asperger compreendeu a importância central da atitude do professor no seu próprio trabalho com crianças. Ele escreveu em 1944: “estas crianças frequentemente mostram uma surpreendente sensibilidade à personalidade do professor (…) E podem ser ensinados, mas somente por aqueles que lhes dão verdadeira afeição e compreensão. Pessoas que mostrem delicadeza e, sim, humor. (…) A atitude emocional básica do professor influencia, involuntária e inconscientemente, o humor e o comportamento da criança.” (Idem)
Embora seja sabido que muitas crianças com SA possam ser administradas em classes regulares, elas frequentemente precisam de algum suporte educacional. Serviços de fonoaudiologia podem ser desnecessários, mas um terapeuta da fala na escola pode ser bastante útil como consultores para o resto do staff, sugerindo caminhos para endereçar problemas em áreas como linguagem pragmática. (Idem)
É sempre ter especial atenção a este tipo de situações, uma vez que só tardiamente existe alertas por parte dos profissionais para este mesmo facto. É de salientar, tal como foi dito anteriormente, o alerta por parte dos profissionais da educação é relevante, bem como a colaboração do próprio staff.
Existem alguns princípios que devem ser seguidos para crianças com este tipo de desordem, tais como:
as rotinas de classe devem ser mantidas tão consistentes, estruturadas e previsíveis quanto possível. Crianças com SA não gostam de surpresas. Devem ser preparadas previamente, para mudanças e transições, inclusive as relacionadas a paragens de agenda, dias de férias, etc.;
as regras devem ser aplicadas cuidadosamente. Muitas dessas crianças podem ser nitidamente rígidas quanto a seguir regras quase que literalmente. É útil expressar as regras e linhas mestre claramente, de preferência por escrito, embora devam ser aplicadas com alguma flexibilidade;
o staff deve tirar toda a vantagem das áreas de especial interesse quando leccionado. A criança aprenderá melhor quando a área de alto interesse pessoal estiver na agenda. Os professores podem conectar criativamente as áreas de interesse como recompensa para a criança por completar com sucesso outras tarefas em aderência a regras e comportamentos esperados;
muitas crianças respondem bem a estímulos visuais: esquemas, mapas, listas, figuras, etc. Sob esse aspecto são muito parecidas com crianças com PDD e Autismo;
tentar ensinar baseado no concreto. Evitar linguagem que possa ser interpretada erroneamente por crianças com SA, como sarcasmo, linguagem figurada confusa, etc. Procurar interromper e simplificar conceitos de linguagem mais abstractos;
ensino didáctico e explícito de estratégias pode ser muito útil para ajudar a criança a ganhar proficiência em “funções executivas” como organização e habilidades de estudo;
tentar evitar luta de forças. Essas crianças frequentemente não entendem demonstrações rígidas e teimosos se forçados. O eu comportamento pode ficar rapidamente fora de controle, e nesse ponto é normalmente melhor para o terapeuta interromper e deixar esfriar. É sempre preferível, se possível, antecipar essas situações e tomar acções preventivas para evitar a confrontação através de serenidade, negociação, apresentação de escolhas ou dispersão de atenção. (Bauer, 1995)
As abordagens psicoterapeuticas com enfoque na terapia comportamental, a aprendizagem de competências sociais são mais efectivas do que as terapias centradas na emoção, que pode ser bastante desconfortável ou stressante para estas crianças.
Aconselhamento e psicoterapia é bastante importante pois ajuda as crianças a arranjar estratégias de coping para a situação de estarem “socialmente em desvantagem”. Saliento assim, instrução e treino parental, intervenção educacional, treino de competências sociais, etc.
Muitas crianças e adultos com SA não precisam de algum tipo de fármacos, enquanto outros, para serem tratados somaticamente, uma vez que não existem fármacos específicos para esta desordem, são utilizados os psicofármacos para tratar os problemas de crianças com SA.
Muitos dos fármacos usados no tratamento de PDD tal como o Autismo, são usados para tratar também a SA, tais como: Ritalin, Addrerall, Paxil, Prozac, Risperal, entre outros. Temos ainda Desipramina e Nortiptylina (antidepressivos tricíclicos), estabilizadores de humor (Valproate, Lítio), beta – bloqueadores (Nadolol, Clonidina), temos ainda a Fluoxetina e a Clomipramina, entre outros.
Tal como a maioria dos psicofármacos, estes têm efeitos secundários e o risco de adição pode ir contra o processo terapêutico e é necessário ter em atenção esse processo, pois o risco é maior em crianças.
Referências
American Psychiatric Association (1994). Diagnostic and Statistical Manual of mental Disorders. 4ª ed. Washington, DC: Autores.
Baron – Cohen, S. (1993). From attention – goal psychology to belif-desire psychology: the development of a theory of mind ant its dysfunction. In Understanding other Minds. Perspectives from Autism (eds. S. Baron – Choen, H. Tager – Flusberg & D. J. Cohen). Oxford: Oxford University Press.
Bauer, S. (1995). Asperger Syndrome – trought the lifespan. New York, The developmental unit, Genesee Hospital Rochester.
Hosborn, R. (1995). Autism and the Development of Mind. Hove: Lawrence Erlbaum.
Tager – Flusberg, H. (1993). What language reveals about the understanding of minds in children with autism. In Undestanding Other Minds. Perspectives from Autism (eds. S. Baron – Cohen, H. Tiger – Flusberg, & D. J. Cohen). Oxford: University Press.
Paulo Teixeira
Artigo publicado no site www.psicologia.com.pt
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Envelhecendo passo a passo
Resumo
Na sociedade do progresso, é cada vez mais evidente o stress existente na população. O corre-corre do quotidiano faz com que as pessoas se desgastem mais rapidamente e não parem para pensar. É notório, que cada vez existe menos tempo para o cuidado pessoal e para os outros. Numa época em que os idosos estão em maioria, principalmente no nosso país, é de salientar que os nossos “olhos” se voltem mais para essa população. O processo de envelhecimento toca a todos e muitas vezes só nos lembramos que estamos “velhos” a partir de uma certa idade. O cuidar da saúde, quer a nível psicológico, quer a nível médico, deve ser um factor principal na vida de cada ser humano e a prevenção deve estar incluída. Contudo, como todos sabemos isso não acontece! Este trabalho visa, em traços gerais, alguns conceitos e conhecimentos acerca do processo de envelhecimento importantes para todos, quer para os técnicos de Geriatria, quer para a restante população, pois todos nós iremos passar por esse ciclo.
O envelhecimento é um fenómeno biológico, psicológico e social que atinge o ser humano na plenitude de sua existência, modifica a sua relação com o tempo, o seu relacionamento com o mundo e com sua própria história.
O relacionamento do idoso com o mundo caracteriza-se pelas dificuldades adaptativas, tanto emocionais quanto fisiológicas; a sua performance ocupacional e social, o pragmatismo, a dificuldade para aceitação do novo, as alterações na escala de valores e a disposição geral para o relacionamento objectual. No relacionamento com a sua história, o idoso pode atribuir novos significados a factos antigos e os tons mais maduros da sua afectividade passam a colorir a existência com novas matrizes; alegres ou tristes, culposas ou de mérito, frustrantes ou gratificantes, satisfatórias ou sofríveis. Por tudo isso, a dinâmica psíquica do idoso é exuberante, rica e complicada. (Ballone, G. J, 2000).
A percepção de Morin (1999b), acerca do processo de envelhecimento é de que o ser humano, rejeitando a morte como rejeita, recusando-a com todas as suas forças, tende a rejeitar também a velhice; talvez por ser a fase da vida que mais se aproxima da morte, tornando a velhice um peso. Para este autor, sendo o ser humano marcado pela consciência da tragédia da morte, ele tenta inventar os mitos para negá-la ou para encontrá-la, pensando nos meios como aceitá-la. Sendo assim, dá-se conta que o problema da consciência e do ser humano é atravessado pelo tempo e tornado trágico pela morte.
Morin acredita que é difícil perceber a origem, o motor do processo de envelhecimento, pois para ele o carácter patológico da velhice manifesta-se em três planos: no social, na percepção de que a velhice sadia é patológica enquanto velhice em si, na própria morte que é patológica e é aproximada pela velhice. Finalizando suas reflexões, Morin aceita que a velhice e a morte estão inscritas na herança genética humana e que “são coisas normais e naturais, porque uma e outra são universais e não sofrem qualquer excepção entre os mortais” (Morin, 1997).
Morin (2000b) chama-nos a atenção para a perda de autoridade que os idosos enfrenta à medida que o desenvolvimento das civilizações acontece. Para o autor, os impulsos juvenis aceleram a história, tornando-se mister não mais a experiência acumulada, mas o que ele denomina de “adesão ao movimento”, o que torna a experiência dos idosos desusada.
Freud afirma, com notável sabedoria, que os determinantes patogénicos envolvidos nos transtornos mentais poderiam ser divididos em duas partes:
1. aqueles que a pessoa traz consigo para a vida e;
2. aqueles que a vida lhe traz.
Na senilidade isso fica mais evidente ainda, por um lado os factores que o indivíduo traz consigo na sua constituição e, por outro lado, os factores trazidos a ele pelo seu destino. O equilíbrio psíquico do idoso depende basicamente da sua capacidade de adaptação à sua existência presente e passada e das condições da realidade que o cercam. (idem)
Assim sendo, as representações sociais constituem formas de conhecimentos socialmente elaborados que são produzidos pelos grupos de indivíduos para poder comunicar e entender tudo aquilo que lhe é estranho e não familiar (Teixeira, M.C. et al., 2002). Nem todos os assuntos se tornam um objecto de representação social para os grupos e, nem todos os fenómenos do mundo que rodeiam o indivíduo são tributários de se converterem em problemas de pesquisa científica da representação social (Teixeira, M.C. et al., 2002). Moscovici (1981), define representação social da seguinte forma: “ por representação social nós queremos dizer um conjunto de conceitos, afirmações e explicações originadas no decurso do quotidiano, no decurso das comunicações interindividuais. Elas são equivalentes na nossa sociedade, aos mitos e sistemas de crenças das sociedades tradicionais; elas podem até mesmo ser vistas como uma versão contemporânea de senso comum.”
O conceito de representação social permite explicar o lugar que ocupa a representação nas sociedades pensantes. Moscovici (1981) faz uma distinção entre os universos de conhecimentos consensuais e os universos de conhecimentos reificados. O primeiro universo é constituído a partir das nossas experiências e informações que recebemos e transmitimos através das tradições, da educação e da comunicação social entre os grupos. Aqui, cada indivíduo é um pensador amador e um emissor de opiniões e de pontos de vista na base das conversações diárias e todos têm os mesmos direitos de criar e de transmitir representações sociais. No universo reificado, a sociedade é vista como um sistema de diferentes papéis e classes, cujos membros são desiguais, e que atingirão o lugar desejado em correspondência com a sua competência profissional.
O interesse da Psicologia sobre a velhice é relativamente recente, visto que expansão sistemática da Gerontologia só ocorre no final da década de 1950, principalmente em função do rápido crescimento do número de pessoas idosas. (Araújo, F. L.(2005). Aspectos sócio-históricos e psicológicos da velhice. In. Revista de Humanidades, 6, 13.)
Começam em 1928 as primeiras pesquisas experimentais sobre a velhice, a respeito de tópicos tais como: aprendizagem, memória e tempo de reacção. No entanto, até 1940, pouco se pesquisou sobre a vida adulta e velhice, considerando que até então esta foi a época de expansão e consolidação da Psicologia da infância e da adolescência. (Baltes, 1995).
Segundo Baltes (1995), a evolução do campo da Psicologia do envelhecimento, no século XX, acarretou mudanças também na natureza da Psicologia do desenvolvimento que, em vários países, especialmente nos EUA, era um campo sobreposto ao da Psicologia infantil.
Basicamente, a rápida emergência da Psicologia do envelhecimento foi uma consequência da confluência dessas duas correntes de interesses, originadas a partir da Psicologia do desenvolvimento. Primeiro: houve uma curiosidade acerca da repercussão da infância sobre o desenvolvimento anterior, ou seja, que consequências teriam, para a velhice, as experiências de desenvolvimento ocorridas na infância e na adolescência. Segundo: os psicólogos que trabalhavam com a vida adulta e velhice passaram a estender o âmbito dos seus conhecimentos e estudos para a direcção oposta do curso de vida. (Baltes, 1995)
Erik Erikson um dos pioneiros nos estudos sobre o desenvolvimento humano, com a formulação da Teoria do Desenvolvimento durante toda a vida, explicitava que o desenvolvimento processa-se ao longo da vida e que o sentido da identidade de uma pessoa desenvolve-se através de uma série de estágios psicossociais durante toda a vida (Bee & Mitchell, 1984)
Esta teoria compõe-se por oito estágios, sendo o período de vida adulta (considerado após os 41 anos) denominado de integridade do ego versus desespero, sendo que a Integridade do ego é caracterizada por factores intrínsecos à velhice como: dignidade, prudência, sabedoria prática e aceitação do modo de viver, e desespero seriam possivelmente medo da morte. Erikson, através destes estudos, contribuiu significativamente para a compreensão das transformações ocorridas na velhice, salientando-se que, até então, nenhum outro autor na psicologia havido dado ênfase ao estágio do desenvolvimento humano contemplando a vida adulta. (Araújo, F. L.(2005). Aspectos sócio-históricos e psicológicos da velhice. In. Revista de Humanidades, 6, 13.)
Como apontam Bee & Mitchell (1984), a teoria de Erikson colabora no sentido de oferecer sínteses sobre o desenvolvimento cognitivo e da personalidade, sobretudo na vida adulta. Após o desenvolvimento desta teoria, passaram-se décadas na psicologia sem a formulação de uma outra teoria do desenvolvimento humano contemplando a vida adulta.
Outra teoria desenvolvida por Gould (1978) enfatiza os processos do desenvolvimento da velhice, seguindo uma abordagem similar à de Erikson, propondo também estágios de desenvolvimento. Estas teorias desencadearam, dentro da Psicologia do desenvolvimento, relevância a este estágio, pois neste período já era despertado, em várias áreas do conhecimento, sobretudo na Gerontologia, o interesse em conhecer melhor os fenómenos peculiares ao processo de envelhecimento e da velhice. (Araújo, F. L., 2005)
Segundo Neri (1995), a Psicologia do envelhecimento é hoje a área que se dedica à investigação das alterações comportamentais que acompanham o gradual declínio na funcionalidade dos vários domínios do comportamento psicológico, nos anos mais avançados da vida adulta.
Aspectos gerais do envelhecimento
A senescência é o processo natural do envelhecimento, o qual compromete progressivamente aspectos físicos e cognitivos. Segundo a OMS, a terceira idade tem início entre os 60 e os 65 anos. Entretanto, esta é uma idade instituída para o efeito de pesquisa, já que o processo de envelhecimento depende de três classes de factores principais: biológicos, psíquicos e sociais. São estes factores que podem preconizar a velhice, acelerando ou retardando o aparecimento e a instalação de doenças e de sintomas característicos da idade madura. (Pereira, A.; Freitas, C.; Mendonça, C.; Marçal, F.; Souza, J.; Noronha, J.; Lessa, L.;Melo, L.; Gonçalves, R.; Sholl-Franco, A., 2004)
Alterações Neurofisiológicas durante o envelhecimento
O envelhecimento fisiológico compreende uma série de alterações nas funções orgânicas e mentais devido exclusivamente aos efeitos da idade avançada sobre o organismo, fazendo com que o mesmo perca a capacidade de manter o equilíbrio homeostático e que todas as funções fisiológicas gradualmente comecem a declinar (Straub et al., 2001; Leite, 1990). Tais alterações têm por característica principal a diminuição progressiva da reserva funcional. Isto significa dizer que um organismo envelhecido, em condições normais, poderá sobreviver adequadamente, porém, quando submetido a situações de stress físico, emocional, etc., pode apresentar dificuldades em manter a sua homeostase e, desta forma, manifestar sobrecarga funcional, a qual pode culminar em processos patológicos, uma vez que há o comprometimento dos sistemas endócrino, nervoso e imunológico (Straub et al., 2001; Jacob et al., 1994)
O envelhecimento do ponto de vista fisiológico, depende significativamente do estilo de vida que a pessoa assume desde a infância ou adolescência, tais como fumar cigarros, praticar regularmente exercício físico, ingerir alimentos saudáveis, tipo de actividade ocupacional, etc. (Leite, 1990). O organismo envelhece como um todo, enquanto que os seus órgãos, tecidos, células e estruturas sub-celulares têm envelhecimentos diferenciados, parecendo este fenómeno ser determinado, basicamente pela hereditariedade (Weineck, 1991).
Durante o envelhecimento vários processos fisiológicos se modificam. Por exemplo, no sistema nervoso, ocorre diminuição do volume do sistema nervoso central (perda de neurónios e outras substâncias) e as fibras nervosas perdem a sua mielina – responsável pela velocidade de condução do estímulo nervoso. (Straub et al., 2001; Berger, L.; Mailloux – Poirier, M., 1995)
As funções intelectuais também se alteram, como por exemplo: dificuldade nos processos de aprendizagem e de memorização, o que provavelmente está relacionado com as alterações químicas, neurológicas e circulatórias que afectam a função cerebral; diminuição da eficácia da oxigenação e nutrição celular e diminuição na aprendizagem associada ás deficiências nas sinapses e na disponibilidade de determinados neurotransmissores (Braver e Brach, 2002. In Pereira, A.; Freitas, C.; Mendonça, C.; Marçal, F.; Souza, J.; Noronha, J.; Lessa, L.;Melo, L.; Gonçalves, R.; Sholl-Franco, A., 2004).
Teorias biológicas do envelhecimento
1. Teoria do Envelhecimento Celular
Os esforços para compreender o papel da célula no fenómeno de envelhecimento tiveram início em 1891, quando Weismann especulou sobre a existência de um potencial limitado da capacidade de duplicação das células somáticas nos animais superiores (Rose, M.R, 1991). Contudo, só mais tarde Hayflick e Morhead (1961) confirmaram experimentalmente esta suposição. Os estudos desenvolvidos por Hayflick deram um contributo valioso para a evolução das teorias gerontológicas, tendo como objecto de estudo o fenómeno do envelhecimento celular. Até então, os estudos desenvolvidos em células somáticas apontavam para a possibilidade deste fenómeno não ocorrer a nível celular. Esta hipótese teve origem no célebre estudo realizado por Alexis Carrel (1921) que colocou fibroblastos provenientes do coração da galinha em meio de cultura. Os fibroblastos duplicaram indefinidamente, tendo Carrel decidido terminar a cultura voluntariamente após 34 anos. Os resultados deste estudo foram confirmados numerosas vezes, em tecidos animais e humanos, e levaram os biogerontologistas a considerar que as células, quando mantidas em meio de cultura, eram imortais e, por isso, não seria possível estudar o fenómeno de envelhecimento ao nível da célula. Este fenómeno resultaria, assim, da interacção fisiológica das células apenas quando estão organizadas em tecidos ou órgãos. No entanto, após terem alterado o meio de cultura, Hayflick e Morhead (1961) constataram que os fibroblastos humanos normais têm a capacidade finita de duplicação celular. Estes investigadores demonstraram que, quando células normais de embrião humano crescem em condições favoráveis, o fenótipo de envelhecimento e a morte são uma consequência inevitável após cerca de 50 duplicações da população. Desta forma, os autores demonstraram que a morte da cultura de células humanas normais não se deve a algumas causas triviais, que envolvem os componentes ou condições do meio de cultura, mas é antes uma consequência das características genéticas das próprias células. As diferenças entre os resultados obtidos por Carrell (1921) e os observados por Hayflick e Morhead (1961) podem ser explicadas pelas características do meio de cultura utilizado e pelos cuidados na sua manutenção. Com efeito, Hayflick (Hayflick, L., 1980, Hayflick, L., 1961, Macieira-Coelho, A., 1970) refere que nas experiências em que os fibroblastos evidenciaram um tempo de vida ilimitado, o meio de cultura estava contaminado por vírus ou compostos capazes de induzir mutações nas células em cultura, tornando-se cancerosas. (Duarte, J.A., Figueiredo, P.A., Mota, M.P., 2004)
A aceitação destes resultados pela comunidade científica da época não foi pacífica, tendo sido atribuídos erros na confecção do meio de cultura e na possível contaminação por vírus (Hayflick, L., Morhead, P.S., 1961). De acordo com a perspectiva vigente na época, o segredo do elixir da juventude poderia residir no meio em que as células vivem. (idem)
Posteriormente, Hayflick (1980) identificou dois tipos de células in vivo que têm comportamentos diferentes in vitro. Estes dois tipos de células são: (1) células normais, diploides e mortais e (2) células cancerosas anormais, heteroploides e imortais. O comportamento destas células in vitro é diferente, tendo as primeiras uma capacidade de duplicação finita, enquanto que nas segundas esta capacidade é infinita. Esta constatação foi um marco importante no estudo do fenómeno de envelhecimento celular. (Duarte, J.A., Figueiredo, P.A., Mota, M.P., 2004)
Outro contributo valioso da investigação conduzida por Hayflick foi a descrição das propriedades das células diploides, que permitiu explicar a existência de um potencial de duplicação celular inferior nas células adultas, comparativamente às células embrionárias. (Macieira-Coelho, A., 1970)
Os estudos genéticos em humanos, relacionados com a longevidade, são normalmente desenvolvidos em gémeos. (Curtsinger, J.W., Fukui, H.H., Khazaeli, A.A., Kirscher, A., Pletcher, S.D., Promoislow, D.E., Tatar, M., 1995) De acordo com estes autores, as reduzidas dimensões das amostras, assim como a semelhança do meio envolvente, tendem a limitar a utilidade dos resultados destes trabalhos. Num estudo com uma amostra considerável (600 pares de gémeos dinamarqueses monozigóticos e dizigóticos), nascidos no século XIX, foi encontrada uma influência da hereditariedade na longevidade de apenas 30% (McGue, M., Vaupel, J., Holm, N., Harvald, B., 1993). A existência de um único gene responsável pelo fenómeno de envelhecimento em humanos parece pouco provável, apesar de terem já sido identificados alguns genes relacionados com doenças específicas de idades avançadas. Certos alelos específicos do gene da apoplopoproteina E estão associados a um aumento do risco de desenvolvimento tardio da doença de Alzheimer (Curtsinger, J.W., Fukui, H.H., KHazaeli, A.A., Kirscher, A., Pletcher, S.D., Promoislow, D.E., Tatar, M., 1995). Há também variações nos alelos dos receptores da vitamina D, em que alguns alelos estão associados a uma maior susceptibilidade para a osteoporose (Morrison, N.A., Qi, J.C., Tokita, A., Kelly, P.J., Crofts, L.,Nguyen, T.V., Sambrook, P.N., Eisman, J.A., 1994). Os polimorfismos genéticos do gene HLA (Human Leucocyte Antigen) estão associadas a muitas doenças hereditárias e parecem contribuir para acentuar os processos de envelhecimento secundário (Miller, R.A., 1996). Outro exemplo é do gene WRN (gene responsável pela Síndrome de Werner), localizado no cromossoma 8, responsável pelo envelhecimento acelerado dos indivíduos com Sindroma de Werner (Martin, G.M., Oshima, J., 2000). Em humanos normais, a investigação dos gerontogenes tem permitido identificar genes responsáveis pelo desenvolvimento de doenças associadas à idade, mas não genes específicos do fenómeno de envelhecimento como acontece em organismos mais simples, como em nematóides e em leveduras. (Duarte, J.A., Figueiredo, P.A., Mota, M.P., 2004)
2. Teoria dos Telómeros
A existência de um tempo de vida finito nas células eucariotas normais, e a capacidade das células cancerosas em superá-lo, pode depender dos telómeros (Marx, J., 1994). Estas estruturas, compreendem sequências de nucleótidos que protegem as extremidades dos cromossomas da sua degeneração e da fusão com outros cromossomas, prevenindo a instabilidade genómica (Blackburn, E.H., 1997; Carrel, A. 1921; Itahana, K., Dimri, G., Campisi, J., 2001; Kurenova, E.V., Mason, J.M., 1997;Marx, J. 1994; Mu, J., Wei, L.X., 2002). Para além destas funções, os telómeros desempenham também um papel importante indirecto no controlo da proliferação das células normais e no crescimento anormal do cancro (Hackett, J.A., Feldser, D.M., Greider, C.W., 2001). Na ausência da telomerase, uma enzima que adiciona repetições sucessivas de bases de DNA telométrico aos telómeros, em cada duplicação celular a célula perde entre 50 e 201 pares de bases (bp) de DNA telométrico (Itahana, K., Dimri, G., Campisi, J., 2001; Mu, J., Wei, L.X., 2002). Aparentemente, as células humanas deixam de se dividir quando o comprimento final do DNA telométrico atinge aproximadamente 4-7 bp (15 a 20 nas células geminais) prevenindo, assim, a fusão com outros cromossomas (Itahana, K., Dimri, G., Campisi, J., 2001). O encurtamento dos telómeros ocorre porque a maioria das células somáticas normais não sintetiza telomerase (Itahana, K., Dimri, G., Campisi, J., 2001). No entanto, nas células cancerosas, a síntese de telomerase é activada, o que poderá contribuir para a capacidade destas células se dividirem continuadamente (Marx, J., 1994). A telomerase é uma ribonucleoproteina cujas subunidades de ácido ribonucleico (RNA) inclui sequências que complementam a guanina da repetição telométrica (Kurenova, E.V., Mason, J.M., 1997). O RNA serve como um template para a síntese de repetições telométricas, e pode ainda desempenhar um papel chave na afinidade química da enzima (Kurenova, E.V., Mansos, J.M., 1997; Marx, J., 1994). Contudo, como Hayflick e Morhead (1997) demonstraram, as linhas de células normais dos mamíferos não são imortais, o que poderá ser o resultado do encurtamento progressivo dos telómeros. Apesar de serem já conhecidos alguns factores que podem interromper a divisão celular e induzir posteriormente a morte quando o telómero fica muito pequeno, há ainda um longo caminho a percorrer para que se conheçam todos os mecanismos e factores que lhe estão associados. Sabe-se que à medida que as células se aproximam da fase da senescência replicativa começam a expressar a proteína p53, resultante de um gene supressor tumoral, que interrompe o ciclo celular nas fases G1 e S (Marx, J., 1994). Esta proteína é particularmente importante no controlo do ciclo celular, estando a sua inactivação ou mutação associada a um aumento da proliferação celular, independentemente do comprimento dos telómeros (Itahana, K., Dimri, G., Campisi, J., 2001). Por outro lado, tem sido constatado um aumento de p53 nas células em fase de senescência replicativa e nas células em que o DNA foi lesado por ERO (idem). Desta forma, a possibilidade de surgirem células com informação genética alterada é prevenida, mesmo que o comprimento dos telómeros permita a continuação da proliferação celular. Por outro lado, se os factores estocásticos induzirem mutações nesta proteína, inactivando-a, poderão sobrepor-se aos mecanismos genéticos de controlo do fenómeno de envelhecimento celular. (Duarte, J.A., Figueiredo, P.A., Mota, M.P., 2004).
Estes dados indicam que o papel dos telómeros no fenómeno de envelhecimento celular poderá não ser tão decisivo como tem sido descrito. Os telómeros poderão ter um papel preponderante no envelhecimento tecidular onde as células mantêm a sua capacidade proliferativa ao longo da vida do indivíduo, embora nos tecidos compostos por células pós-mitóticas, tais como os neurónios e os cardiomiócitos, a sua função seja mais restrita. O fenómeno de envelhecimento nestes tecidos deve-se, provavelmente, à acumulação de lesões celulares sucessivas induzidas por factores de natureza química ou mecânica, como por exemplo, o aumento do stress oxidativo nas células nervosas (Barja, G., Herrero, A., 2000; Lezza, A.M., Mecocci, P., Cormio, A., Beal, M.F., Cherubini, A., Cantatore, P., Senin, U., Gadaleta, M.N., 1999). A diminuição significativa do número de células funcionais, quer por morte celular ou por incapacidade de reparação de danos, poderá determinar a funcionalidade dos respectivos órgãos, culminando com a morte do indivíduo. De facto, em órgãos constituídos, fundamentalmente, por células permanentemente pós-mitóticas a “Teoria dos Telómeros” não se aplica. O processo de envelhecimento destes órgãos parece depender muito mais da acção dos factores estocásticos, do que dos mecanismos de regulação genética. Neste sentido, o “relógio biológico” que determina a longevidade do indivíduo, parece não fazer sentido quando a análise deixa de ser a longevidade das linhas de células em cultura e se passa a considerar um indivíduo como um todo. A “Teoria dos Telómeros” é ainda posta em causa quando se tenta explicar as diferenças de longevidade entre as espécies animais com base no comprimento destas estruturas. Ou seja, seria de esperar que o maior comprimento dos telómeros das células mitóticas estivesse associado a uma maior longevidade da linha celular, o que não acontece (Sherr, C.J., DePinho, R.A., 2000).
3. Teoria Neuro-endócrina
Uma das teorias genéticas do fenómeno de envelhecimento mais relevantes é a “Teoria Neuro-endócrina” (Finch, C.E., 1976/1994) e constitui uma hipótese alternativa para explicar a degeneração funcional associada à idade. De acordo com esta teoria, o nível de envelhecimento é o resultado do declínio de diversas hormonas do eixo hipotálamo-pituitária-adrenal que controlam o sistema reprodutor, o metabolismo e outros aspectos do funcionamento normal de um organismo (Cristofalo, V.J., Gerhard, G.S., Pignolo, R.J., 1994; Finch, C.E., 1976; Levin, E.R., 2001; Miller, R.A., 1994; Sonntag,W.E., Lynch, C.D., Cefalu, W.T., Ingram, R.L., Bennett, S.A., Thornton, P.L., Khan, A.S., 1999). O sistema neuro-endócrino, controlado pelo hipotálamo e pela glândula pituitária, regula a libertação e inibição das hormonas segredadas para a circulação sanguínea sob influência dos neurotransmissores e neuropeptideos (Sarkar, D.K., Hentges, S., De, A., Reddy, R., 1998; Terry, L.C., Halter, J.B., 1994). Esta teoria defende que a actividade do hipotálamo depende da expressão de genes específicos, os quais, independentemente da influência dos factores estocásticos, alteram a sua expressão com a idade, condicionando um conjunto de funções directamente dependentes do sistema neuro-endócrino (Johnson, S.A., Finch, C.E., 1996).
Assim, a “Teoria Neuro-endócrina” considera que a incapacidade fisiológica do organismo associada à idade pode ser explicada com base na alteração hormonal resultante da modificação da expressão genética. As hormonas têm um importante papel trófico e integrativo na manutenção da função dos tecidos, pelo que a sua deficiência tem como resultado a deterioração da função tecidular (Sonntag,W.E., Lynch, C.D., Cefalu, W.T., Ingram, R.L., Bennett, S.A., Thornton, P.L., Khan, A.S., 1999).
4. Teorias Estocásticas
As Teorias Estocásticas sugerem que a perda de funcionalidade que acompanha o fenómeno de envelhecimento é causada pela acumulação aleatória de lesões, associadas à acção ambiental, em moléculas vitais, que provocam um declínio fisiológico progressivo (Cristofalo, V.J., Gerhard, G.S., Pignolo, R.J., 1994). Várias teorias estão incluídas neste grupo, entre as quais se destacam a Teoria das Mutações Somáticas, a Teoria do Erro-Catástrofe, a Teoria da Reparação do DNA, a Teoria da Quebra de Ligações, a Teoria da Glicosilação Avançada e a Teoria do Stress Oxidativo (Duarte, J.A., Figueiredo, P.A., Mota, M.P., 2004).
4.1. Teoria das Mutações Somáticas
A “Teoria das Mutações Somáticas” foi uma das primeiras tentativas de compreensão do fenómeno de envelhecimento ao nível molecular. Esta teoria surgiu da constatação que doses de radiações sub-letais são frequentemente acompanhadas por uma diminuição do tempo de vida (Curtis, H., 1963).
Os efeitos das radiações ionizantes no encurtamento do tempo de vida orientaram a investigação para o estudo das alterações no DNA relacionadas com a idade. Os dados provêm de estudos que avaliaram a ocorrência de mutações espontâneas determinadas indirectamente pela substituição de aminoácidos, erros na síntese de DNA e resistência às purinas citotóxicas (Finch, C.E., 1976; Miller, R.A., 1994).
Os efeitos das radiações e a forma como o organismo reage à sua agressão são objecto de estudo de outras teorias como a “Teoria da Reparação do DNA” e a “Teoria do Stress Oxidativo”. Neste sentido, parte da investigação que utiliza as radiações ionizantes como agente stressor tem estado associada ao estudo do cancro da pele. Mediante a alteração de proteínas específicas que controlam o ciclo celular, tal como a p53, e à diminuição da capacidade de reparação das lesões do DNA ao longo do fenómeno de envelhecimento (Goukassian, D., Gad, F., Yaar, M., Eller, M.S., Nehal, U.S., Gilchrest, A.H., 1999). O aumento das lesões oxidativas do DNA nas células expostas a radiações ionizantes (Wei, H., Ca, Q., Rahn, R., Zhang, X., Wang, Y., Lewohl, M., 1998) tem também sido utilizado para explicar a influencia do stress oxidativo no fenómeno do envelhecimento, um dos mecanismos que maior aceitação tem vindo a adquirir pela comunidade cientifica para a compreensão deste fenómeno (Duarte, J.A., Figueiredo, P.A., Mota, M.P., 2004)
4.2. Teoria do Erro-catástrofe
Esta teoria do envelhecimento celular, proposta por Orgel (1963), postula que os erros na síntese de uma proteína podem ser utilizados na síntese de outras proteínas, levando a uma diminuição progressiva da fidelidade e à eventual acumulação de proporções de proteínas aberrantes, potencialmente letais. Estes erros assumem significado especial quando afectam proteínas envolvidas na síntese de DNA, resultando na perda de fidelidade do DNA replicado, aumentando, consequentemente, as mutações somáticas e originando, eventualmente, patologias e disfunção celular (Martin, G.M., Hoehn, H., Norwood, T.H., 1980). Para testar esta teoria, Harley et al. (1980) determinaram a frequência dos erros na síntese proteica em várias culturas de fibroblastos de dadores humanos, jovens e idosos. Como corolário desta teoria deveria verificar-se uma menor velocidade da ocorrência de erros traducionais nos fibroblastos transformados em linhas permanentes (imortais) do que nas células envelhecidas. No entanto, contrariamente ao esperado, Harley et al. (1980), constataram uma maior velocidade de erros na síntese proteica nas células imortais do que nas envelhecidas. Estas células (provenientes de dadores jovens, idosos, de indivíduos com Progeria ou com Síndrome de Werner), possuíam proteínas idênticas às observadas nas fases mais jovens em cultura. Os resultados destes estudos apontam para uma baixa influência da ocorrência de erros na tradução das proteínas no fenómeno de envelhecimento (Duarte, J.A., Figueiredo, P.A., Mota, M.P., 2004).
Para testar a “Teoria do Erro-catástrofe”, Edelmann e Gallant (1977), promoveram a não incorporação de cisteína na flagelina. Quando o crescimento da Escherichia Coli ocorria na presença de estreptomicina (aumenta os erros de translação), a taxa de mal incorporação de cisteína na flagelina aumentava ate cerca de 20 vezes, após seis gerações. No novo estado de equilíbrio, não havia perda de viabilidade celular, apesar do crescimento ser mais lento. Depois de remover a estreptomicina, a frequência do erro voltou rapidamente ao nível inicial. Este estudo demonstra que o aumento substancial de erros não é compatível com a continuação da proliferação celular da bactéria, em condições em que parece pouco provável que a selecção por resistência ocorra. Este estudo demonstra, ainda, que aumentos significativos de erros não têm de precipitar erros-catástrofe (Finch, C.E., 1994). A capacidade de remover estas proteínas alteradas esta comprometida nas células envelhecidas, contribuindo, assim, para a sua progressiva acumulação (Halliwell, B., Gutteridge, J.M.C., 1989).
4.3. Teoria da Reparação do DNA
Hart e Setlow (1974) desenvolveram a “Teoria da Reparação do DNA”. De acordo com estes autores, é a velocidade de reparação do DNA que determina o tempo de vida de indivíduos de espécies diferentes e entre indivíduos da mesma espécie. Estas condições foram retiradas com base na constatação de diferentes velocidades de fibroblastos em cultura, expostos à luz ultravioleta, de dadores de sete espécies de mamíferos. No entanto, estes resultados não foram confirmados em estudos posteriores realizados com outras espécies de mamíferos (Whoodhead, A.D., Setlow, R.B., Grist, E., 1980). Para testar as diferenças entre indivíduos da mesma espécie, os investigadores colocaram a hipótese da capacidade e da eficiência de reparação, nas células em cultura próximas do seu tempo de vida limite, serem consideravelmente menores do que nos primeiros dias de cultura. Diversos estudos constataram uma perda progressiva da capacidade de reparação do DNA lesado pelas radiações ionizantes, com a idade (Goukassian, D., Gad, F., Yaar, M., Eller, M.S., Nehal, U.S., Gilchrest, A.H., 2000; Ishikawa, T., Sakurai, J., 1986; Lambert, B., Ringborg, U., Skoog, L., 1979), acompanhada por uma diminuição da velocidade de remoção dos produtos da lesão do DNA e dos níveis de proteína p53 com a idade (Goukassian, D., Gad, F., Yaar, M., Eller, M.S., Nehal, U.S., Gilchrest, A.H., 2000). Estes autores sugerem que o fenómeno do envelhecimento é acompanhado por uma diminuição da sensibilidade da proteína p53 ao DNA lesado, aumentado a susceptibilidade das células desenvolverem fenótipos cancerosos. Vários factores podem estar na origem da acumulação de lesões do DNA. De facto, o aumento do peróxido de hidrogénio originou uma acumulação de produtos da lesão oxidativa do DNA, que inibiram a reparação do mesmo pelo N-acetoxi-2-aacetilaminofluoreno, um indutor da reparação do DNA, em leucócitos humanos (Pero, R.W., Anderson, M.W., Doyle, G.A., Anna, C.H., Romagna, F., Markowitz, M., Bryngelson, C., 1990). Este estudo demonstra que o stress oxidativo pode ser um dos mecanismos responsáveis pelo aumento da acumulação de moléculas de DNA danificadas com a idade, não só porque interage directamente com as mesmas, como também inibe os mecanismos de reparação das lesões.
A maioria dos estudos que testaram a alteração da capacidade de reparação do DNA ao longo do envelhecimento utilizou células mitóticas em cultura. Neste tipo de células, a capacidade de reparação do DNA diminuiu com a proximidade do término da cultura (Goukassian, D., Gad, F., Yaar, M., Eller, M.S., Nehal, U.S., Gilchrest, A.H., 2000; Ishikawa, T., Sakurai, J., 1986; Lambert, B., Ringborg, U., Skoog, L., 1979; Pero, R.W., Anderson, M.W., Doyle, G.A., Anna, C.H., Romagna, F., Markowitz, M., Bryngelson, C., 1990). No entanto, nas culturas de células diferenciadas, provenientes de tecido nervoso e muscular, a capacidade de reparação do DNA lesado pelas radiações ionizantes foi pouco alterada com a proximidade do fim da cultura (Hanawalt, P.C., Gee, P., Ho, L., 1990).
4.4. Teoria da Glicosilação
As reacções de glicosilação na modificação de proteínas são, actualmente, consideradas como um dos principais mecanismos responsáveis pelo fenómeno de envelhecimento celular. A “Teoria da Glicosilação” sugere que a modificação de proteínas pela glicose e a associação de reacções de Maillard (Vlassara, H., 1990) levam à formação de ligações cruzadas graduais no colagéneo que são características nos indivíduos idosos (Cerami, A., 1995; Monnier, V., Cerami, A., 1981). Esta teoria postula que as ligações cruzadas, causadas pelo elevado nível de glicemia e de glicose tecidular, conduzem à deterioração estrutural e funcional dos tecidos (Hayoz, D., Ziegler, T., Brunner, H.R., Ruiz, J., 1998).
A adição não enzimática de açucares a grupos de aminoácidos livres, ocorre quer in vitro, quer in vivo com uma velocidade de reacção que depende do tipo de açúcar (Vlassara, H., 1990). Dos monossacárdios em circulação, a D-glicose é a que menos reage espontaneamente, enquanto que a D-galactose, comparativamente, reage cinco vezes mais rápido (Bunn, F., Higgings, P.J., 1981). Esta reacção, designada reacção de Maillard, resulta da ligação covalente entre um grupo aldeído livre do açúcar com um grupo amina da proteína. Para alem dos grupos amina das proteínas, também os grupos amina das bases de DNA são alvos potenciais de glicosilação (Vlassara, H., 1990). Geralmente as aldoses reagem mais rapidamente com os grupos amina livres das proteínas do que as cetoses (Bunn, F., Higgings, P.J., 1981). O produto da glicosilação passa, então, por um re-arranjo para uma cetoamina pouco estável conhecida como produto Amadori (Vlassara, H., 1990). Com o aumento da idade, é comum surgirem perturbações na regulação da homeostasia da glicose em humanos. Enquanto que em jejum a glicose sanguínea aumenta ligeiramente com a idade, após uma refeição, ou após a ingestão de glicose, o aumento é mais acentuado (Goldberg, A.P., Coon, P.J., 1987). Estas alterações vão-se acentuando com a idade e resultam, aparentemente, de uma diminuição da sensibilidade dos tecidos à insulina (Chen, M., Bergman, R.N., Porte, D., 1988). Os efeitos da idade na capacidade secretora de insulina, para uma grande quantidade de glicose sanguínea, são controversos, mas a maioria dos autores é unânime em afirmar que a capacidade máxima das células β do pâncreas em secretar insulina, quando estimulada suficientemente, não é alterada de forma significativa (Finch, C.E., 1994). Os produtos finais da glicosilação são colectivamente designados por AGE (advanced glycation endproducts) (Lee, A., Cerami, A., 1990) ou produtos Maillard avançados. As possíveis disfunções causadas pelos AGE incluem:
Aumento da pressão arterial devido à aterogenese, hipoteticamente por glicosilação das lipoproteinas de baixa densidade (LDL);
Perda da acomodação ocular;
Incapacidade funcional das “células T de memória” ;
Inactivação da Cu,Zn-SOD, nos erotrócitos, diminuindo a capacidade antioxidante do sangue (Arai, K., Maguchi, S., Fujii, S., Ishibashi, H., Oikawa, K., Taniguhi, N., 1987; Vlassara, H., 1990)
4.5. Teoria do Stress Oxidativo
O envolvimento dos radicais livres (RL) no fenómeno do envelhecimento e na doença foi proposto pela primeira vez por Harman ( 1956). Este autor considera que o fenómeno de envelhecimento é o resultado da acumulação de lesões moleculares provocadas pelas reacções dos RL nos componentes celulares ao longo da vida, que conduzem à perda de funcionalidade e à doença com o aumento da idade, conduzindo à morte (Duarte, J.A., Figueiredo, P.A., Mota, M.P., 2004).
As camadas electrónicas de um elemento químico são denominadas K, L, M e N e os seus sub-níveis de s, p, d e f. De uma maneira simples, o termo radical livre refere-se a um átomo ou molécula altamente reactivo, que contém número impar de electrões na sua última camada electrónica. É o não emparelhamento de electrões da última camada que confere alta reactividade a esses átomos ou moléculas (Ferreira, A.L.A et al., (1997). Radicais Livres: conceitos, doenças relacionadas, sistema de defesa e stress oxidativo. Revista Ass Med Brasil, 43 (1), pp. 61-68).
Os RL existem em abundância na natureza, porém, aqueles que devido à sua elevada toxicidade biológica adquiriram maior importância são os radicais livres de oxigénio tal como o supeóxido (O2-•), que é derivado do oxigénio molecular (O2). O O2 é um composto de dois elementos de oxigénio (O), cujo número atómico é 8. Para formar o oxigénio molecular (O2), os dois electrões solitários do sub-nível p de um elemento oxigénio fazem intercâmbio com os dois electrões de outro elemento oxigénio, formando um composto estável com 12 electrões na última camada (L). É conveniente recordar que as reacções de redução implicam um ganho de electrões, e as de oxidação, em perda. Portanto, quando no metabolismo normal ocorrer uma redução de oxigénio molecular (O2), este ganhará um electrão, formando o radical superóxido, considerado instável por possuir número ímpar (13) de electrões na última camada L (Idem). Na verdade, radical livre não é o termo ideal para designar os agentes patogénicos, pois alguns deles não apresentam electrões desemparelhados. Tendo em conta esta característica, são frequentemente designados de espécies reactivas de oxigénio (ERO).
Contudo, foram identificadas outras espécies derivadas dos RL de oxigénio que são, o peróxido de hidrogénio (H2O2) e o ácido hipocloroso (HOCl). Estes compostos por não conterem electrões desemparelhados, são altamente tóxicos para o organismo, não podendo assim serem considerados RL.
Por definição, stress oxidativo consiste num desequilíbrio entre oxidantes e antioxidantes a favor do primeiro. A reacção de um RL com outra molécula produz um RL diferente, que pode ser mais ou menos reactiva do que a espécie original. Este processo tende a repetir-se continuadamente terminando, apenas, quando a extremidade radical que contém o electrão desemparelhado formar uma ligação covalente com o electrão desemparelhado de outro radical (Chang, R., 1994).
O estudo sobre os mecanismos de lesão oxidativa tem, progressivamente, confirmado a acção catalítica dos metais nas reacções que levam a estas lesões. O papel dos metais na formação das ERO é confirmado pelas reacções de Fenton e de Haber Weiss.
É sugerido que no traumatismo craneoencefálico ocorram ERO por mecanismo tipo Fenton. A liberação do ferro intracelular, a baixa capacidade de ligação ferro-proteína e a deficiência de enzimas antioxidantes no sistema nervoso central ampliam os riscos de lesão induzida pelo trauma (Halliwell, B., (1991). In. Ferreira, A.L.A et al., (1997). Radicais Livres: conceitos, doenças relacionadas, sistema de defesa e stress oxidativo. Revista Ass Med Brasil, 43 (1), pp. 61-68). O papel do ferro neste tipo de agressão é demonstrado pela diminuição da degeneração cerebral pós-traumática em animais experimentais que recebem quelante de ferro.
Existem assim, diversas doenças associadas a esta teoria e o seu papel no envelhecimento. A nível pulmonar teremos: Enfisema, Displasia broncopulmonar, Pneumoconiose, Fumo, entre outras. Outras doenças já consagradas e bastante discutidas da literatura teremos: Doença de Parkinson, Alzheimer, Esclerose Múltipla e Catarata.
Os subprodutos das ERO podem ser aferidas directamente por técnica de ressonância paramagnética de electrões, porém o custo e outras limitações desta avaliação dificultam o seu uso rotineiro. Os métodos mais utilizados para aferição indirecta das ERO e, consequentemente, das lesões oxidativas são os espectrofotométricos e cromatométricos, que medem a actividade enzimática (SOD, catalase, GSH-Px e GSH-Rd) e/ou a concentração de tripeptídeos (GSH, GSSG) e aldeídos (MDA). Estas medidas podem ser realizadas em tecidos, sangue e outros fluidos. A lipoperoxidação de membranas é habitualmente monitorizada pelo método MDA (malonaldeído) e o stress oxidativo, por dosagens de GSSG e/ou pelo cálculo da razão GSSG/GSH (Ferreira, A.L.A et al., (1997). Radicais Livres: conceitos, doenças relacionadas, sistema de defesa e stress oxidativo. Revista Ass Med Brasil, 43 (1), pp. 61-68).
Convém salientar que as ERO podem ser causa ou consequência de doenças humanas associadas ao stress oxidativo. Por isso, antioxidantes naturais e sintéticos têm sido recomendados para o alívio dos sinais e sintomas dessas doenças e, mesmo, para bloquear a sua evolução. No entanto, muito deve ser investigado acerca do benefício dos antioxidantes exógenos. É imperativo determinar o momento exacto, a dose, a via de administração e qual o antioxidante ideal para cada doença. Até ao momento não existem estudos que respondam com segurança a estas indagações. Portanto, a utilização indiscriminada de fármacos que contenham antioxidantes exógenos deve ser criteriosamente avaliado na terapêutica de doenças associadas ao stress oxidativo (Ferreira, A.L.A et al., (1997). Radicais Livres: conceitos, doenças relacionadas, sistema de defesa e stress oxidativo. Revista Ass Med Brasil, 43 (1), pp. 61-68)
Terminando a exposição das teorias biológicas do envelhecimento, convém realçar o papel da Psicologia no envelhecimento, apesar de já ter sido dada uma breve introdução no início deste artigo.
De acordo com a World Health Organization (2002), o envelhecimento constitui um fenómeno de uma população e de uma pessoa. Como fenómeno de uma população, expressa o êxito da humanidade, dado que representa o resultado dos descobrimentos humanos e dos avanços de higiene, nutrição, tecnologia médica e conquistas sociais, entre outros. Como fenómeno individual, o envelhecimento constitui uma matéria de estudo bio-psico-social. Isto é, a ciência do envelhecimento é multidisciplinar. O envelhecimento humano não se pode descrever, predizer ou explicar sem se ter em conta os três aspectos do mesmo: o biológico, o psicológico e o social.
Todos sabemos que o Homem é um ser biológico, mas o processo inerente ao homem, não é só biológico, mas sim também psicológico e social. Existem provas empíricas acumuladas durante os últimos decénios que confirmam a importância das condições psicológicas como predictoras da longevidade e da qualidade de vida.
Tal como já foi dito anteriormente, na perspectiva biológica, o envelhecimento define-se como um fracasso normativo de adaptação que finalmente produz um declive no organismo.
As condições psicológicas não seguem o mesmo padrão de deterioração ao longo da vida que as condições biológicas. A psicologia da atenção, memória e aprendizagem, o afecto e a emoção, a psicologia do desenvolvimento, a personalidade, a psicologia social, têm compartilhado o envelhecimento como objecto de estudo (Consejo General de Colégios Oficiales de Psicólogos (2002). II Assembleia Mundial Sobre Envejecimiento, Espanha, Julho, 82)
A Psicologia é fundamental na definição empírica de tais conceitos, assim como do estudo das suas determinantes. O programa de capacidade de reserva cognitiva, isto é, a expressão comportamental da propriedade do cérebro humano: a plasticidade, poderia definir-se como a capacidade de aprendizagem, informação, estratégias ou habilidades que compensem deteoros cognitivo prévios. A plasticidade cognitiva é um programa de investigação básica e que constitui uma das directivas do Plano de Acção Internacional: a educação continua. A aprendizagem ao longo da vida, a educação contínua e a actividade cognitiva, são objectivos prioritários, não só para o desenvolvimento e a participação dos adultos, mas também porque afectam a saúde (tanto física como mental) (Consejo General de Colégios Oficiales de Psicólogos (2002). II Assembleia Mundial Sobre Envejecimiento, Espanha, Julho, 82)
A OMS (2002), definiu o envelhecimento activo como “o processo de optimização das oportunidades de saúde, participação e segurança para melhorar a qualidade de vida à medida que se envelhece….(que permita) que as pessoas desenvolvam o seu potencial de bem-estar físico, social e mental ao longo de toda a sua vida e participem conforme as suas necessidades, desejos e capacidades”.
O modo de actuar, de pensar, sentir e interpretar a realidade de uma pessoa, constituem condições psicológicas relacionadas com a saúde, a participação social e a segurança da velhice. Os factores psicológicos e comportamentais dependem de transacções ao longo da vida e de todo o ciclo vital entre um organismo e o seu contexto sócio-histórico (Consejo General de Colégios Oficiales de Psicólogos (2002). II Assembleia Mundial Sobre Envejecimiento, Espanha, Julho, 82).
A Psicologia e o psicólogo, têm como objectivo geral optimizar o processo adaptativo, tanto com intervenções sobre as necessidades do próprio sujeito, bem como do seu ambiente familiar e social. As necessidades seguintes, representam áreas de intervenção prioritárias:
Necessidade de promover a Psicologia da saúde e o bem-estar no decurso da vida: chegar a uma velhice num estado de bem-estar e boa saúde, requer acções desde a infância e durante toda a vida. A psicologia, juntamente com outras ciências é uma disciplina chave para que ao longo de todo o ciclo vital as pessoas desenvolvam estilos de vida independentes e saudáveis.
Necessidade de avaliação/intervenção psicológica na saúde mental das pessoas idosas: conhecer as características e necessidades psicológicas dos idosos permite melhorar o serviço, tomar decisões sobre recursos e estabelecer programas de intervenção a nível psicológico que facilitem a prevenção, reabilitação e a reincorporação na comunidade.
Necessidade de avaliação/intervenção psicológica em pessoas idosas com deficiência: a Psicologia esta claramente vocacionada para a prevenção primária, secundária e terciária em pessoas com deficiência físicas ou psíquicas. A incidência da deficiência aumenta com a idade e, por isso, a intervenção psicológica será cada vez mais frequente e necessária. Por outro lado aumentam as necessidades de atenção psicológica a pessoas com deficiência que chegam à velhice especialmente com deficiência cognitiva (demências) e intelectuais.
Necessidade de apoio psicológico ás famílias: cuidar de uma pessoa (crianças, adultos e idosos) que necessita de ajuda supõe um recto para a sociedade em geral e em particular para a família. A convivência, a responsabilidade que concerne ao cuidado das pessoas com algum grau de deficiência, implica momentos de inquietude, sobretudo quando são os esposos/as, os próprios pais, filhos, ou netos quem necessitam de ajuda. As vezes, viver de forma positiva esta experiência, depende tanto da atitude com que se enfrenta a situação. Diminuir as consequências negativas a nível psicológico derivadas do cuidado e atenção, convertem-se numa prioridade.
Necessidade de integração social e comunitária das pessoas idosas: os psicólogos podem contribuir para melhorar a integração social dos idosos analisando e intervindo nos factores psicológicos e psicossociais através de campanhas de divulgação sobre a função dos idosos na sociedade, ou estratégias para mudar estereótipos de forma a favorecer a integração e fomentar sistemas de apoio informal que permitam uma maior aceitação dos idosos na sociedade e de medidas alternativas ao internamento em residências.
Necessidades de formação a outros profissionais sobre aspectos psicológicos implicados na atenção de pessoas idosas: o trabalho com idosos exige uma aquisição e desenvolvimento de habilidades e competências relacionais necessárias para serem eficazes no exercício da sua função. É de especial relevância os aspectos psicológicos incluídos nos cuidados paliativo/enfermarias terminais e morte, assim como, a atenção a idosos com necessidades especiais (Consejo General de Colégios Oficiales de Psicólogos (2002). II Assembleia Mundial Sobre Envejecimiento, Espanha, Julho, 82)
A evolução clínica nos pacientes idosos inclui um apoio, não só a nível dos problemas, mas também na criação de estratégias de coping (Gall, J.S., Szwabo, P.A, (2002). Psychological Aspects of Aging. Clinical Geriatrics, 10(5), pp. 48-52)
O sucesso no envelhecimento tem múltiplas componentes e variadas definições. Para alguns, o sucesso é medido em termos de doença e saúde; para outros, a preservação das habilidades ou adaptabilidade pode ser crítica. Uma definição abrangente de envelhecimento deve incluir três componentes: baixo risco de doença e o conhecimento acerca da doença; um alto nível de funcionamento mental e físico e um envolvimento activo no ciclo vital (Gall, J.S., Szwabo, P.A, (2002). Psychological Aspects of Aging. Clinical Geriatrics, 10(5), pp. 48-52)
A performance física vai mudando com a idade ao longo da vida. Programas onde regularmente ocorra actividade física, têm provado haver benefícios nas pessoas idosas. A implementação de um programa de exercício ou a recomendação de um programa por parte de profissionais especializados, devem de fazer parte do quotidiano das pessoas idosas. O relacionamento interpessoal, bem como o envolvimento em actividades tem um significado e um propósito pessoal na sua vida. A principal questão para um envelhecimento saudável é descobrir ou redescobrir os relacionamentos próximos e o seu significado nas suas actividades (Idem).
Todas as pessoas são confrontadas com questões específicas da idade que devem ser ultrapassadas com estratégias de coping ao longo do ciclo vital. Isto requer uma boa estratégia de coping para lidar com o novo bem como com uma variedade de informações que têm origem, quer interna, quer externamente. A pessoa idosa deve confrontar e aceitar a sua vida conforme ela é, assumindo a responsabilidade em todos os seus aspectos, incluindo as falhas. Um modelo alternativo ao de Erickson, é o modelo dos papéis sociais, que nos indica que a pessoa idosa é submetida a muitas mudanças de papéis em função da velhice. Essa alteração é acompanhada por mudanças associadas ao conceito de si próprio. Infelizmente, à medida que a idade vai avançando, a sociedade impõe um número crescente de restrições nos papéis que estão disponíveis. Assim, é muito provável que o seu auto-conceito fique afectado. Como consequência, existe o isolamento, e posteriormente a depressão. O estereótipo negativo acerca do envelhecimento, principalmente crenças acerca do inevitável declínio de funções, permanece muito enraizado. Tais estereótipos levam outros adultos a sentir que nada mais podem fazer para evitar tais declínios na sua saúde e funcionamento à medida que envelhecem. Contudo, algumas investigações indicam que os idosos podem ser encorajados a ver o envelhecimento como uma época em que continuarão a dar “passos” para promover um bem-estar saudável. Isto deve incluir exercício físico regular, dieta saudável, não fumar e manter contactos sociais regulares (Idem).
Como foi referido, a depressão é um dos factores que atinge o idoso e quando essa atinge um estádio mais profundo, em que o idoso começa a analisar o passado, como sendo horrível, o presente como deprimente, somando o medo do que pode vir a acontecer, surgem em muitos casos o impulso suicida (McKenzie, K, 2001). Realmente, o idoso é acompanhado por inúmeros factores que aumentam o risco de suicídio, tais como, o facto de se sentir à parte da sociedade, doenças físicas graves, além dos casos em que sofrem maus tratos e negligência. Nesse momento, o suicídio parece ser a solução para os seus problemas (Silva, E.M.M., Silva Filho, C.E., Fajardo, R.S., Fernandes, A.,Ú.,R., Marchiori, A.V., 2005)
O stress é outro dos aspectos psicossociais inerentes ao processo de envelhecimento. Uma definição geral de stress diz-nos que é o resultado não específico de uma queixa existente sobre o corpo. Um dos aspectos mais notáveis do stress consiste no facto de situações diferentes, ou eventos diferentes poderem causar stress. Todos os Humanos estão expostos a situações de stress. A natureza do agente stressor e a maneira como o ser humano lida com a situação, vai-se modificando ao longo dos anos. Existem vários estudos levados a cabo sobre o stress nomeadamente sobre o suporte social, distresse psicológico e o relacionamento interpessoal. Uma forte evidência, comum a todas estas pesquisas é de que o efeito adverso do stress é baixo para aqueles que têm um forte sistema de suporte social. Por exemplo, aqueles que estão sujeitos a níveis significativos de stress prolongado, reportaram que têm uma recuperação lenta e uma maior vulnerabilidade para contrair doenças após dois anos de exposição ao agente stressor (Idem).
Uma fonte significativa de stress para a pessoa idosa é a confrontação de perdas sucessivas: morte (esposa/o, filhos, netos) e perda de controlo de tomada de decisão relacionados com assuntos como saúde, mobilidade, situação de vida, finanças, etc., que tem efeito no sistema de suporte social do indivíduo. Viver sozinho aumenta as crises financeiras, problemas de saúde crónicos e solidão (Idem).
Uma consideração significativa no tratamento de pessoas idosas é referente ao processo de reforma, pois esta mudança de estilo de vida leva a pessoa a poder ser confrontada com agentes stressores. Embora muitos indivíduos estejam ansiosos pelo processo de reforma, outros, temem a sua aproximação e não estão preparados para tal acontecimento. Muitas pessoas já têm uma ideia pré-concebida ou planos para a sua reforma, mas uma pequena percentagem encontra uma discrepância entre as suas expectativas e a realidade, quando é chegado o acontecimento (Idem).
A auto-estima, segundo Montenegro et al. (1998), é hoje considerada a razão primordial para uma vida útil e feliz nos últimos anos de vida. Manetta et al. (1998), enfatizam a importância da manutenção do sorriso para um melhor relacionamento com o meio em que o indivíduo vive, tornando-o mais feliz, o que melhora a sua saúde geral.
Reabilitação Neuropsicológica
Um conceito que tem bastante importância, com vista à Reabilitação neuropsicológica, é o da plasticidade neural, segundo a qual os neurónios adjacentes a uma lesão, podem progressivamente “aprender” a função da parte danificada (Rossini, P.M., Pauri, F., 2000).
Para Luria, a lesão cerebral produz, em primeiro lugar, uma inibição temporal das tarefas intactas. Junque e Barroso (1994), explicam-nos que esta inibição tem lugar através do sistema colinérgico. As funções alteradas por esta inibição podem ser restauradas mediante terapia farmacológica desinibidora e desbloqueante. Juntamente a isto, uma intervenção psicológica pode ajudar a que a desinibição se produza num ritmo mais acelerado. Em segundo lugar, a lesão produz alterações funcionais que são a consequência da destruição directa do tecido cerebral (Cela, J.L.S., Herreras, E.B., 2005).
A reabilitação neuropsicológica pode ter dois objectivos gerais: (1) favorecer a recuperação de funções, isto é, a recuperação da função em si mesma, dos meios, capacidades ou habilidades necessárias para alcançar determinados objectivos e (2) favorecer a recuperação de objectivos, trabalhar com o doente para que possa desenvolver e alcançar determinados objectivos usando meios diferentes ao usado antes da lesão. No primeiro caso é a restituição da função e no segundo caso é a substituição ou compensação (Idem).
Antes de se iniciar um programa de reabilitação, é necessário conhecer que mudanças ou melhoras são explicadas pela recuperação espontânea e que não são atribuídas à nossa intervenção. Qualquer lesão cerebral é sempre acompanhada de uma certa margem de recuperação funcional espontânea e, depois de superados os processos traumáticos da lesão, produz-se uma reorganização das sinapses nas zonas não lesionadas (Idem).
De uma forma geral pode-se afirmar que o objectivo principal da reabilitação é a optimização no funcionamento físico, vocacional e social depois de uma doença ou dano neurológico (Rusk, H.A., Block, J.M., Lowman, E.W., 1969). Munõz e Ruiz (1999) propõem como objectivos básicos de um programa de reabilitação neuropsicológica: (1) proporcionar um modelo que ajude o paciente e a sua família que ajude a entender o que ocorreu, (2) proporcionar estratégias de treino de habilidades para recuperar e compensar os deficits cognitivos, melhorar a actuação do paciente em diferentes situações sociais e ajudar o paciente a estabelecer compromissos realistas de trabalho e de relações interpessoais e (3) promover um ambiente realístico de esperança (Cela, J.L.S., Herreras, E.B., 2005).
Os programas de reabilitação devem caracterizar-se por ser programas holísticos, desenvolvidos por profissionais, interdisciplinares, com validade ecológica, fazendo uso da evolução qualitativa bem como quantitativa (León – Carrión, 1998, Fernandéz – Guinea, 2001). Têm-se que atender a vários aspectos fundamentais:
Reabilitação das funções cognitivas: segundo Machuca, Mdrazo, Rodriguez e Dominguez (2002) os deficits cognitivos que com mais frequência se observam no tratamento craneoencefálico são os de orientação, memória, atenção, linguagem, funcionamento de execução, destacando os transtornos visuoperceptivos, solução de problemas e tomada de decisão. As áreas cognitivas mais favorecidas por este tipo de intervenção são a atenção, a memória e o funcionamento executivo.
Reabilitação das funções executivas: Munõz e Tirapu (2004) estabelecem uma declaração de princípios gerais que emergem das hipóteses actuais sobre o funcionamento dos lobos frontais: (1) aplicação de uma estratégia RPIEL (I: Identificar, D: Definir, E: Eleger, A: Aplicar e L: Lucros), (2) intervenção sobre as variáveis cognitivas relacionadas com um funcionamento executivo (memória de trabalho, atenção dividida, habilidades pragmáticas, motivação), (3) uso de técnicas de modificação de conduta para incidir sobre comportamentos relacionados com este síndrome (especialmente distracção, impulsividade, desinibição, e perseveração), (4) aplicação de técnicas de reforço diferencial (preferivelmente o custo de resposta), (5) deve-se ter em conta as variáveis da situação num programa de reabilitação, (6) os programas de reabilitação devem ser ecológicos, isto é, devem conter estratégias específicas de generalização.
Ojeda del pozo et al. (2000) consideram como elemento essencial da reabilitação neuropsicológica o treino de habilidades sociais. A redução do nível de habilidades sociais que se observam nestes indivíduos esta notavelmente condicionado pelo nível de funcionamento cognitivo da pessoa afectada, assim como a influencia e a interacção das variáveis. A intervenção neste âmbito centra-se em três dimensões: treino de soluções de problemas sociais, treino de habilidades pragmáticas da comunicação e treino de auto-control (Cela, J.L.S., Herreras, E.B., 2005).
Modificação das condutas desadaptativas e intervenção nas alterações de conduta e emocionais provocadas pelo dano cerebral mediante a utilização de técnicas de modificação de conduta. Os transtornos emocionais que persistem como sequelas dos traumatismos craneoencefálicos, dificultam a integração familiar, social e laboral dos pacientes e determinam em grande parte o prognóstico da reabilitação.
A reabilitação laboral, orientada e dirigida à adequação de um posto de trabalho ajustado ás funções cognitivas preservadas, potenciando as habilidades psicossociais necessárias para ele. A actividade laboral oferece inúmeras vantagens, contudo também expõe a pessoa a situações de stress, competitividade, medo de fracasso, etc., que podem afectar o grau de satisfação no emprego e a permanência no mesmo.
A orientação e terapia familiar é um requisito indispensável para facilitar o processo reabilitador da pessoa afectada como para o bem-estar e a adaptação à nova situação familiar (Cela, J.L.S., Herreras, E.B., 2005).
O apoio psicossocial tem efeitos decisivos sobre a saúde mental. O processo de reabilitação muitas vezes é tão longo quanto a vida, daí que se deva enquadrar num ambiente familiar e social saudável, onde a cooperação e a colaboração são dois factores importantes (Munõz, J.M., Ruiz, M.J., 1999).
Existem assim declives substanciais no envelhecimento, quer biológicos, quer psicológicos, nomeadamente a nível de funções cognitivas e comportamentais. É também certo que existe uma diferença no volume do cérebro, principalmente no córtex pré-frontal. Actualmente já existem formas de se efectuar um diagnóstico precoce neste grupo etário, contudo muito mais deve ser feito.
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Paulo Teixeira
Artigo publicado no site www.psicologia.com.pt
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Demência Fronto-Temporal
Resumo
As síndromes demenciais podem ser classificadas em degenerativas e não-degenerativas. As demências não degenerativas podem ocorrer de AVC, processos infecto-contagiosos, traumatismos, etc. Os processos demenciais degenerativos podem ter origem cortical ou subcortical. De todas as demências degenerativas corticais, a doença de Alzheimer tem maior frequência estatística. As Demência Fronto-Temporal (DFT) estão em segundo lugar no ranking das demências. Como anteriormente a doença de Alzheimer era a mais conhecida, muitos dos pacientes que hoje em dia estão diagnosticados como Alzheimer, podem sofrer de uma demência Fronto-Temporal. Os pacientes com DFT apresentam um deficit de memória importante na recuperação da informação, mas com melhores capacidades de registo de informação, apesar das dificuldades de reconhecimento do seu distúrbio.
História
Atribui-se a Esquirol (séc. XIX), a diferença entre atraso mental e demência, baseando-se no carácter adquirido pela última e a introdução destes estados dentro do âmbito da Psiquiatria. (In biopsicologia.net)
Nos princípios do século passado foram definidos como uma síndrome geral que afecta as capacidades de entendimento, recordação e compreensão. A terminologia francesa “Demence”, empregue por Esquirol na sua obra “Des malades mentales” (Paris, 1838), propagou-se, junto com as numerosas traduções da sua obra, incorporando-se o termo em Psiquiatria. (Idem)
Posteriormente, ao longo do século, produziu-se um fenómeno caracterizado pela definição cada vez mais restrita do conceito de demência, deixando-se de considerar um estado terminal ao qual conduziam todas as doenças mentais. Concretamente vão-se distinguir duas linhas conceptuais: a psicológica, referida à deterioração intelectual e médica, referida à irreversibilidade produzida pelas lesões anatomo-patológicas. (Idem)
Este amplo conceito reduz-se quando, a partir da raiz psicológica e não da médica, Morel (1856) descreve a demência precoce. A introdução dos conceitos de estupor e de confusão descritos por Chasslin, determina a separação das demências agudas e reversíveis. (Idem)
Em 1907, Alois Alzheimer, Neuropsiquiatra alemão, descobriu o primeiro caso da doença que leva o seu nome, uma mulher de 51 anos com deteriorização cognitiva, alucinações, delírios e sintomas focais, cujo estudo cerebral post-mortem revelou a existência de atrofia cortical, placas, etc. Outro apontamento fundamental ao conhecimento das demências é efectuada por Arnold Pick, professor de Neuropsiquiatria em Praga, que começou a descrever em 1892 uma série de casos de demência com atrofia cerebral localizada nos lobos frontais. (Idem)
No início do séc. XX o interesse pelas demências decresceu consideravelmente. Considerava-se que a doença de Alzheimer não era mais que uma forma rara de demência pré-senil. Nos anos 50/60 acreditava-se que a maioria das pessoas que desenvolviam uma síndrome demencial depois dos 65 anos (a chamada demência senil) sofriam de alguma forma de insuficiência cérebro-vascular a chamada demência arteriosclerótica. (Idem)
Nos finais da década de 50 e durante os anos 60, os trabalhos da escola inglesa de Psiquiatria, começaram a supor uma alteração na forma de entender o problema. Estes autores realizaram uma série de estudos epidemiológicos, clínicos, neuro-patológicos e neuro-histológicos em pacientes diagnosticados clinicamente de demência senil. Os resultados mostraram que 70% dos pacientes apresentavam factores neuropatológicos tais como as placas senis e os novelos neurofibrilares descritos por Alzheimer. (Idem)
Desde então, o interesse por este grupo de doenças tem crescido de forma considerável nos últimos 30 anos, quando apenas se ocupa uma mínima parte dos tratados de Psiquiatria e Neurologia. Entre os factores que têm contribuído para este estudo destaca-se principalmente as mudanças demográficas que têm incrementado de forma espectacular a frequência absoluta e relativa do número de cidadãos nos países ocidentais e em todo o mundo. (Idem)
Definição
As demências Fronto-Temporais afectam sensivelmente o lobo frontal do cérebro. A doença pode ainda estender-se ao lobo temporal. Existem dois tipos principais de demências: doença de Pick e a demência Fronto-Temporal (DFT). A patologia destas duas condições são diferentes, mas as manifestações clínicas são similares.
O lobo frontal inclui muitos aspectos do funcionamento cerebral e isso inclui: motivação e condução, classificação e categorização, emoção e personalidade. O aspecto social está também influenciado bem como o apetite.
Uma disfunção frontal pode levar a apatia, a um alto nível de desordem de pensamento e mudança de personalidade. A manifestação depende que parte do lobo é afectada (dorso-lateral ou orbitomedial).
Entende-se assim por DFT demências produzidas por atrofia cortical focalizada nos lobos frontais e/ou temporais. (V. Somale (2002); M.N. Rossor, 2001)
Segundo Gregory e Hodges (1996), os critérios clínicos para o diagnóstico da variante frontal da DFT são:
- Apresentação em forma insidiosa e progressiva por um período de 6 meses com pelo menos cinco dos seguintes sintomas:
Falta de auto-crítica;
Desinibição;
Inquietude motora;
Distractibilidade;
Diminuição de empatia e desinteresse;
Falta de perspectivas e de adequada planificação;
Impulsividade;
Asilo social;
Apatia ou falta de iniciativa;
Descuido do aspecto social;
Redução da produção espontânea da linguagem;
Bulimia;
Hiperactividade sexual.
- Preservação da memória de feitos recentes, orientação espacial e praxias;
- Evidencia neuropsicológica de marcada disfunção frontal;
- Ausência de traumatismos Craneo-encefálicos, AVC, Alcoolismo, Parkinson, ou outros movimentos anormais. Escala vascular de Hachiski < 4.
- Pode existir transtornos psiquiátricos tais como condutas violentas.
O lobo pré-frontal pode dividir-se em três áreas diferentes: órbitobasal ou ventromedial, médio ou dorso-lateral. A lesão em cada uma das áreas provoca manifestações clínicas diferentes.
Uma afectação na área órbitobasal trás como consequências desinibição, condutas anti-sociais; comportamentos estereotipados e hiperactividade sexual. Estes pacientes têm falhas específicas no início da doença, sobretudo na tomada de decisão, havendo uma demora na tomada de decisão.
Se a lesão predomina na região medial haverá apatia. Têm sintomas classicamente considerados como diexecutivos tais como planificação e execução de tarefas que se evidenciam em Wiscounsin Card Sorting Test, Teste de Stroop e a redução da fluência verbal são atribuídas a lesões dorso-laterais.
Em contraste com os deficits assinalados anteriormente, estes pacientes têm altas pontuações no Mini Mental State de Folstein (27 a 29/30), o que os diferencia claramente dos pacientes com doença de Alzheimer.
A quase totalidade dos casos diagnosticados em exames post-mortem como sendo não alzheimer, constitui o quadro das DFT, cujos subtipos são: afasia progressiva primária (APP), demência semântica (DS) e demências fronto-temporais (DFT). (Allegri, F. R.; Harris. P.; Serrano, C.; Delavald, N. (2001). Perfis diferenciais de perda de memória entre Demência Fronto-Temporal e a do Tipo Alzheimer. Psicologia : Reflexão e crítica, 14(2), pp. 317-324)
No subtipo designada afasia progressiva primária (APP) incluem-se pacientes que começam, de forma insidiosa e progressiva, com deficit de linguagem, o qual se mantém como o único transtorno cognitivo durante pelo menos dois anos. (Duyckaerts, He, Seilhean, & Hauw, 1995; Mesulam, 1982). Na APP, a afasia apresenta-se isolada e progride sem os componentes habituais de cognição e conduta das demências. Os pacientes com APP obtêm pontuações normais ou às vezes superiores nos testes de raciocínio, habilidades visoespaciais e memória. Sua conduta interpessoal, habilidades sociais, juízo e raciocínio permanecem intactos. A alteração da linguagem, traço característico da APP, habitualmente assume a forma de uma afasia anómica, que evolui depois para uma afasia não fluente do tipo Broca. Apesar de alguns trabalhos que descrevem uma heterogeneidade na evolução do quadro linguístico dos pacientes com doença de Alzheimer (Crystal, Horoupian, Katzman & Jotkowitz, 1981; Joanette, Poissant & Valdois, 1989; Joanette, Ska, Poissant & Béland, 1992. In. Allegri, F. R.; Harris. P.; Serrano, C.; Delavald, N. (2001). Perfis diferenciais de perda de memória entre Demência Fronto-Temporal e a do Tipo Alzheimer. Psicologia : Reflexão e crítica, 14(2), pp. 317-324) também apresentam, entre seus sintomas iniciais, uma afasia anómica que, no entanto, evolui para uma forma transcortical sensorial ou para uma afasia de Wernicke, ambas com um forte componente de falhas de compreensão linguística (Cardebat, Aithamon & Puel, 1995; Habib & Aleggri, 1997)
O segundo subtipo, a demência semântica (DS), reflecte um comprometimento dos sistemas cognitivos especializados no tratamento semântico ( Hodges, Patterson, Oxbury & Funnell, 1992; Hodges, Salomon & Butters, 1998). Enquaanto a memória episódica está relativamente preservada, a semântica apresenta-se profundamente alterada. Observa-se, ainda, através de recursos de neuroimagem, uma atrofia bilateral predominantemente à atrofia hipocãampica-temporal medial da demência de Alzheimer (Habib & Allegri, 1997. In. Allegri, F. R.; Harris. P.; Serrano, C.; Delavald, N. (2001). Perfis diferenciais de perda de memória entre Demência Fronto-Temporal e a do Tipo Alzheimer. Psicologia : Reflexão e crítica, 14(2), pp. 317-324).
O terceiro subtipo de demência degenerativa cortical não Alzheimer, as demências Fronto-Temporais (DFT), tem seu início geralmente na faixa dos 40 aos 60 anos, sendo que não há predomínio de sexo. Os antecedentes familiares são observados em cerca de 50% dos casos (Kumar, Shapiro, Haxby, Grady & Friedland, 1990; Neary e cols., 1986) e a progressão da patologia é gradual, havendo uma oscilação de 3 a 17 anos, quanto ao tempo de evolução da doença (Neary e cols., 1986). Clinicamente, evidenciam-se, no estágio inicial, transtornos de personalidade, condutas anti-sociais e desinibação, sendo que, num momento posterior, aparecem transtornos da linguagem, com anomias, esteriotipias e alterações na compreensão. A memória, o cálculo e a orientação vioespacial começam-se a deteriorar nos estágios moderados da doença. No estágio final, constata-se uma severa deterioração cognitiva global, com o surgimento de uma síndrome de acinesia progressiva e perda da linguagem (Serrano, Ranalli, Butman & Allegri, no prelo).
Os transtornos de personalidade envolvidos na patologia são mudanças de personalidade, tais como a apatia, a desinibição sexual, uma hilariedade inapropriada, o exibicionismo e outras condutas anti-sociais (Benton, 1968). Os fenómenos de desinibição (sexual e hilariante) são, na DFT, as manifestações clínicas mais precoces e antecedem em vários anos à deterioração cognitiva. Outras características frequentes em sujeitos portadores da DFT são a hiperoralidade e a hipermetamorfose. A primeira manifesta-se como um acto de ingestão incontrolada de qualquer alimento ou mesmo de objectos que não constituem alimento. A segunda consiste na tendência a explorar o ambiente impulsivamente, tocando em tudo. A estas características é somada a hipersexualidade, sintoma que remete a uma síndrome do tipo kluver Bucy. (Allegri, F. R.; Harris. P.; Serrano, C.; Delavald, N. (2001). Perfis diferenciais de perda de memória entre Demência Fronto-Temporal e a do Tipo Alzheimer. Psicologia : Reflexão e crítica, 14(2), pp. 317-324).
No que concerne à linguagem, observa-se uma notável diminuição da fluência, surgimento de esteriotipias, ecolalias e condutas verbais reiterativas. A DFT promove uma precoce disfunção da linguagem expressiva, com a compreensão preservada até estágios avançados da patologia. (Idem)
O lobo pré-frontal não é uma estrutura homogénea; ele responde por múltiplas funções e relaciona-se com outras estruturas, corticais e subcorticais. Esta especialização das diferentes áreas do córtex pré-frontal permite descreve-lo basicamente em três divisões funcionais: córtex dorsolateral, córtex orbitofrontal e córtex medial. A estas divisões correspondem distintas síndromes cognitivas e de conduta (Miller e cols., 1991)
A porção dorsolateral recebe informação externa, oriunda dos sistemas sensoriais, e interna, do córtex orbitofrontal e do sistema límbico. Estes dados permitem o lobo pré-frontal monitorizar o input sensorial e avaliar o significado emocional de eventos externos para iniciar uma resposta apropriada. Danos nesta área resultam em falta de resposta e comprometimento da programação motora, além de um prejuízo no automonitoraamento. A região orbitofrontal está mais relacionada ao sistema límbico do que à região dorsolateral. Trata-se do representante cortical do sistema límbico. Uma síndrome orbitofrontal implica condutas anti-sociais, desinibição e inconstância emocional.(Allegri, F. R.; Harris. P.; Serrano, C.; Delavald, N. (2001). Perfis diferenciais de perda de memória entre Demência Fronto-Temporal e a do Tipo Alzheimer. Psicologia : Reflexão e crítica, 14(2), pp. 317-324).
O componente medial, por sua vez, está conectado com a amígdala, o tálamo anterior e o septo. No caso de uma síndrome medial, surge a acinecia como sintoma de conduta. Verifica-se um mutismo acinético, no caso da lesão bilateral, ou negligência intencional, no caso de lesão unilateral. Do ponto de vista linguístico, o paciente pode ter uma afasia motora trascortical. A incontinência e os transtornos na marcha frequentemente acompanham a síndrome. (Idem)
Características clínicas
Os critérios de diagnóstico para as DFT são: início insidioso e a evolução pode ser lenta e gradual; deterioração precoce da conduta interpessoal e no manejo da conduta pessoal; embotamento emocional precoce; perda precoce do insight. Outros traços de ajuda diagnostica são: declínio na higiene e no cuidado pessoal; rigidez e inflexibilidade mental; distractibilidade; hiperoralidade; condutas perserverativas; linguagem esteriotipada; ecolalia; mutismo; incontinência; acinecia; rigidez e tremor. Investigações neuropsicológicas revelam deteriorização significativa nos testes do lobo frontal e ausência de amnésia, afasia ou distúrbio perceptual severo. (Idem)
Epidemiologia
Epidemiologicamente a importância da DFT é mais do que notável, estimando-se que constitui aproximadamente 15% do total das demências degenerativas primárias (Miller et al., 1997; Oliva, R., 2000)
Enquanto que não existe dúvida que a doença de Alzheimer é o tipo mais frequente, com uma prevalência estimada entre 60 a 80% dos casos de demência, tem-se encontrado que muitos dos pacientes que anteriormente haviam sido diagnosticados com a doença de Alzheimer, podem actualmente ser incluídos nos critérios de DFT. (In biopsicologia.net)
Na tabela seguinte, a título de resumo, são apresentados os elementos de diagnóstico clínico da demência Fronto-temporal, segundo a Declaração de Consenso dos Grupos de Investigação e Lund e Manchester (1994).
Transtorno de conduta
Inicio insidioso e evolução lenta
Perda precoce de consciência pessoal e social
Perda precoce de introspecção
Sinais precoces de desinibição (como sexualidade descontrolada, comportamento violento, etc.)
Rigidez mental e inflexibilidade
Condutas estereotipadas e perseverantes
Hiperoralidade
Distractibilidade, impulsividade e falta de persistência
Condutas de utilização 8uso e exploração descontrolados dos objectos)
Sintomas afectivos
Depressão, ansiedade, ideação suicida, delírio
Hipocondria, preocupações somáticas estranhas
Falta de empatia
Inércia, falta de espontaneidade
Transtorno da fala
Redução progressiva e estereotipada da fala
Ecolalia, perseverança
Mutismo tardio
In. Gustffson, L.; Passant, U.(2002). Demência Fronto-Temporal. Diagnóstico e tratamento. Revista de Psicogeriátrica, Vol. 2(1), pp. 22-29
Provas complementares de diagnóstico
O reconhecimento da DFT baseia-se numa avaliação clínica sistemática apoiada em provas neuropsicológicas e estudos distintos de imagem cerebral. Os critérios estabelecidos para a demência Fronto-Temporal incrementaram a precisão diagnostica e a compreensão dos distintos transtornos demenciais que afectam as áreas fronto-temporais do cérebro. (Neary, D.; Snowden, J. S.; Gustafson, L. e al., 1998)
Avaliação neuropsicológica
Nas provas de imagem, tanto funcionais como estruturais, os pacientes com DFT podem mostrar resultados normais ou muito levemente patológicos. Contudo, o estudo neuropsicológico é uma ferramenta importante para poder identificar quais as funções cognitivas e conductuais aparecem deterioradas ou preservadas.
Até ao momento não existe uma “prova ideal” para a DFT. As escalas gerais para medir a demência, como o Mini Mental State (Folstein, M. F.; Folstein, S.E.; McHugh, P.R.1975); não foram desenhadas para estimar principalmente as funções do lobo frontal. Assim, os pacientes com DFT podem mostrar um rendimento normal apesar de terem uma encefalopatia orgânica clinicamente evidente.
Os deficits neuropsicológicos da DFT afectam as funções de execução, mas as habilidades visoespaciais e as praxias estão melhor conservadas (Neary, D.; Snopeden, J.S.; Northen, B.; Gouldning, P.J. 1980; Johanson, A.; hagberg, B.; 1989; Knopman, D.S.; 1989). Contudo, as funções cognitivas são difíceis de avaliar devido às alterações emocionais do paciente e à disfunção da fala. O rendimento aparece especialmente deteriorado nas provas de abstracção, planificação, função organizativa e estratégica e flexibilidade mental.
Electroencefalografia
O electroencefalograma (EEG) pode parecer normal em todo o grupo das DFT, assim que a demência seja clinicamente evidente (Rosén, I.; Gustafson, L.; Risberg, J.; 1993). Contudo, ao prolongar-se a duração da doença e aumentar a gravidade, alguns pacientes podem desenvolver um EEG moderadamente anormais com diminuição das formas das ondas. Isto não acontece em pacientes com doença de Alzheimer, em que o EEG – interpretado convencionalmente – mostra uma alta percentagem de anomalias nas primeiras fases. A análise quantitativa do EEG provavelmente melhorará o diagnóstico diferencial entre DFT, Alzheimer e demência vascular.
Imagens estruturais
A síndrome clínica das DFT progressiva pode associar-se a atrofia cortical com maior ou menos acentuação focal na TAC e na ressonância magnética (RM), apesar destas técnicas serem pouco conclusivas, existindo um importante distanciamento nas técnicas verificados em sujeitos normais (Larsson, E. M.; Passant, U.; Sundgren, P.C. e al. 2000)
Imagens funcionais
A patologia do fluxo focal, localizada bilateralmente no córtex frontal e fronto-temporal, estando melhor conservadas as áreas posteriores, é característica da DFT (Risberg, J. 1980; Passant, U.; Elfgren, C.; Risberg, J. e al. 2000). Isto contrasta decididamente com as anomalias do fluxo que se observam nas áreas temporo-parietais da doença de Alzheimer.
A patologia do fluxo da DFT, contudo, não é especifica desta doença, pois também se observa dano cerebral vascular na doença de Creutzfeldt-Jacob e na doença de Alzheimer de predomínio frontal. Nas primeiras fases de DFT, as leves patologias do fluxo frontal não são específicas, podendo aparecer padrões similares de fluxo como consequência de medicamentos, traumatismos craneo-encefalicos, abuso de substâncias e perturbações psiquiátricas tal como a esquizofrenia (Ingvar, D.H. 1997). Como um dos elementos característicos da DFT é a progressão da patologia, repetir as medições de fluxo ao longo de vários anos é bastante útil em termos informativos (Gustafson, L.; Brun, A.; Passant, U. 1992).
A tomografia por emissão de fotões simples (SPECT) está hoje em dia disponível em muitos lugares e forma uma parte importante na avaliação de pacientes com demência.
Apresentação de caso clínico
O relato do caso clínico que passo a citar foi elaborado por Veras, A. B.; Ayrão, V.; Rozenthal, M. 2003). Os autores descrevem um caso de demência fronto-temporal e o seu diagnóstico diferencial com outros tipos de demência.
Identificação
C.C.M., sexo masculino, 58 anos, branco, casado, brasileiro, natural do Rio de Janeiro, residente em Niteroi, agnóstico, terceiro grau completo, aposentado como economista da Secretaria de Fazenda.
Queixa principal
Não formula.
Motivo de internamento
Heteroagressividade e alteração do comportamento
HDA
Segundo relato da esposa, quando C. tinha 53 anos apresentou humor triste e anedonia, cerca de um ano após a sua aposentação. Iniciou tratamento com medicação anti-depressiva (venlafaxina), mas não sabe informar a dose. Quatro meses após o início do tratamento, apresentou agitação psicomotora, humor irritável e heteroafressividade, tendo sido internado no Hospital Pedro Ernesto (enfermaria de psiquiatria). Recebeu então diagnóstico de transtorno bipolar do humor e iniciou monoterapia com carbonato de lítio. Durante o ano em que usou essa medicação, alternava períodos de apatia e irritabilidade, acrescentando a essa sintomatologia mutismo e atitude alucinatória. Foi procurado outro psiquiatra que suspeitou tratar-se de doença degenerativa e solicitou tomografia do crânio, sorologia para HIV, dosagem de TSH, T4 livre, vitamina B12, folato e sorologia para lues. Todos os exames encontravam-se normais. O comportamento do paciente foi-se progressivamente agravando, apresentando perseveração do pensamento e jocosidade. Tornou-se agressivo com a esposa e filho, não aceitava abordagem de pessoas desconhecidas e tentou agredir a empregada sem motivo aparente. A conduta do psiquiatra foi suspender o carbonato de lítio e iniciar tentativas com anti-psicóticos atípicos – recebeu então o diagnóstico de “doença corpuscular de Lewy”.
Aos 55 anos, realizou uma ressonância nuclear magnética que revelou proeminência de sulcos corticais na região frontal. Começou a apresentar esquecimento de factos recentes e piora dos sintomas já descritos.
Em Novembro de 2001, aos 56 anos, C. saiu de casa para comprar cigarros e ficou perdido por 24 horas, sendo encontrado pela família próximo à sua residência. Apresentava diversas escoriações pelo corpo e edema no cotovelo direito, sendo levado ao ortopedista. Durante a consulta, impulsivamente agrediu o médico.
História patológica progressiva
O paciente apresentou doenças comuns da infância (varicela, sarampo). Nega patologia crónicas (hipertensão arterial, diabetes melito, cardiopatias, doença renal e/ou hepática). Nega também alergias, transfusões sanguíneas, cirurgias e DST’s.
História fisiológica
Tia paterna faleceu aos 56 anos internada num Hospital Psiquiátrico, segundo familiares com quadro semelhante. Não fornecem mais informações.
Pai e mãe falecidos, a família não sabe informar a causa. Irmã com transtorno depressivo major, no momento em remissão.
História pessoal
C. é o mais velho de uma prole de três. Completou o terceiro grau e trabalha desde os 18 anos. Começou a namorar M. (sua actual esposa) na idade de 17 anos e casaram-se aos 20 anos, enquanto ainda cursavam juntos na faculdade. A esposa diz que C. sempre foi um excelente profissional. Participava activamente no partido político da sua cidade. Tiveram um filho, hoje com 30 anos.
Mora com a esposa e o filho em Niterói. Após o inicio da doença, seus contactos sociais foram diminuindo progressivamente. A família nega abuso de álcool ou drogas. Fuma cerca de dois maços de cigarros por dia.
Exame físico
Somatoscopia: paciente apresentando-se emagrecido; normocorado; anictérico, acianótico, normohidratado, eupnético, apiréctico e sem linfonodomegalias. Apresenta extremidades distais de seegundo e terceiro quirodáctilos direitos escurecidos pelo habito de fumar, alem de algumas queimaduras leves na mesma região.
ACV: RCR em 2T; BNF, sem sopros.
Ar: MVUA sem ruídos adventícios.
Abdómen: indolor à apalpação superficial e profunda, ausência de visceromegalias.
Exame neurológico
Marcha atípica; tonus e força muscular preservados.
Reflexos osteotendíneos sem alteração. Reflexo palmomentoniano presente bilateralmente. Reflexo orbicular da boca exacerbado. Reflexo cutaneoplantar em flexão bilateralmente.
Ausência de sinais extra piramidais.
Nervos cranianos sem alteração.
Não apresenta sinais de irritação meníngea, alterações esfincterianas ou tremor de extremidades.
Mini Mental State
Dezembro de 2001 – pontuação de 21/30
25 de Março de 2002 – pontuação de 13/30
Março de 2003 – não coopera
Exame psíquico
Encontramos o paciente no pátio interno da enfermaria masculina com vestes fornecidas pela instituição, que se encontravam sujas de cinza de cigarro e desalinhadas. Encontrava-se descalço e em condições precárias de higiene. Ele dirige-se ao posto de enfermagem, onde pede por cigarro de forma perseverante. Ao abordá-lo e solicitar que nos acompanhe para um outro recinto a fim de realizar uma entrevista, o paciente apenas desvia o olhar em minha direcção e continua pedindo um “cigarrinho”. C. acompanha-me inicialmente sem resistência ao ser conduzido pela mão, mas durante o percurso tenta voltar à enfermaria diversas vezes. Essa resistência é facilmente vencida com a insistência de que me acompanhe ou com a promessa de lhe dar um cigarro.
Ao chegar à sala do exame, o paciente senta-se imediatamente no local indicado. C. permanece com os cotovelos apoiados sobre os joelhos e o olhar fixo numa das pessoas que se encontravam a sua frente na sala. Quando chamado, só desvia o olhar após varias tentativas. Responde correctamente seu nome, mas, em relação às demais perguntas, ou não responde ou o faz de forma breve e pouco compreensível. Diversas vezes levanta-se em direcção à porta, voltando-se a sentar quando interpelado. As etapas do Mini exame de estado mental (Mini Mental State) tornam-se inexequíveis pela atenção praticamente inexistente ao exame. Na ultima vez que o paciente se levanta para deixar a sala apenas o observamos, C. abre a porta e volta calado para a enfermaria.
Súmula psicopatológica
Aparência: descuidada.
Atitude: indiferente e negativista
Fala e linguagem: não-fluente, perseverante; ecolalia
Consciência: sem rebaixamento do nível de consciência
Orientação: desorientação cronopsíquica, desorientação espacial parcial; orientado autopsiquicamente
Consciência do eu: sem alterações ao exame
Atenção: hipotenaz e hipovigil
Pensamentos:
Curso: alentecido
Forma: perseverante
Conteúdo: empobrecido
Sensopercepção: sem alterações
Humor: eutímico
Afecto: tímido
Pragmatismo: hipopragmático
Memória: perda das recordações tardias e da capacidade de fixação
Inteligência: abaixo do grau de escolaridade
Psicomotricidade: empobrecida
Consciência de morbidade: ausente
Planos para o futuro: não formula
Diagnóstico sindómico
Síndrome demencial.
Diagnóstico nosológico
Eixo I Episodio depressivo
Eixo II Empobrecimento intelectual progressivo
Eixo III Demência fronto-temporal (F03 da CID-10)
Eixo IV Início da aposentação coincidente com o início do quadro
Eixo V Dependência de cuidados para a realização de actividades básicas
Diagnóstico diferencial
Demência na doença de Pick (F02.0 – CID – 10)
Demência na doença de Alzheimer (F00 – CID – 10)
Demência na doença Vascular (F01 – CID – 10)
Evolução
Dezembro de 2001
O paciente estava bastante agressivo no início da intervenção; era difícil a abordagem e a equipa de saúde tinha receio da sua agressividade. Em alguns momentos, recusava-se a tomar a medicação oral. Quando abordado, esquivava-se ou tinha atitude ameaçadora, chegando a agredir algumas vezes a equipa de enfermagem. Apresentava também insónia. Foi iniciando tratamento com trazodona (25 mg/dia), com melhora importante da agressividade e insónia. Como o paciente apresentava mussitação, alucinação auditiva e negativismo, foram introduzidos olanzapina 10 mg/dia e lorazepam 6 mg/dia. Após três semanas, ainda apresentava mussitação e alucinação auditiva; a olanzapina foi então substituída por risperidona 3 mg/dia, com boa resposta.
Março 2003
O paciente permanece no leito quase todo o dia. Levanta-se apenas para fumar e para se alimentar. Não cuida espontaneamente da sua higiene pessoal. Não tem apresentado mais episódios de agressividade, mussitação ou alucinações auditivas. Permanece em uso de 25 mg/dia de trazodona e 2 mg/dia de risperidona.
Recebeu alta em Abril do mesmo ano, com seguimento em regime de ambulatório.
Exames laboratoriais relevantes
Transcrição do laudo da RNM de crânio com espectroscopia realizada em 20/02/2002, no Hospital Barra D’or:
“Sulcos corticais e fissuras laterais marcados especialmente nos lobos frontais.” Foco de sinal elevado em T2 e Flair observados na substância branca periventricular, nas coroas radiadas, nos centros semiovais e subcortical frontal à direita. Sistema ventricular dentro dos limites anatómicos. Redução significativa dos níveis relativos do NAA compatível com diminuição da densidade neuronal cortical. Estes achados sugerem possibilidade de processo neurodegenerativo cortical.”
Transcrição do laudo da RM de crânio com espectroscopia realizada em 11/03/2003, no IRM, Humanitá:
“Microangiopatia degenerativa da substancia branca, inalterado em comparação com o exame realizado em 28/03/2001. Hipocampos com volume normal. Importantes alterações espectrais na margem posterior do giro do cíngulo. Redução do número e viabilidade neural frontal associado ao aumento dos níveis de glutamina e glutamato nesta topografia”.
Actualmente acredita-se que nenhuma medicação possa prevenir, reverter ou travar a evolução de DFT. Os fármacos colinérgicos que retardam a progressão da doença de Alzheimer em alguns pacientes não é provável que sirvam para os doentes de DFT, que não apresentem nenhum deficit colinérgico (Proctor, A. W.; Qurne, M.; Francis, P.T., 1999)
Os anti-depressivos potenciadores de serotonina poderiam servir para tratar alguns dos trantornos conductuais. Os antipsicóticos podem aliviar os sintomas de DFT naqueles pacientes que têm delírio ou alucinações. Contudo, estes medicamentos podem, às vezes, exacerbar os sintomas de DFT. Todos os fármacos têm efeitos secundários, mas às vezes, pode-se usar em benefício do doente.
Agradecimentos
Gostaria de apresentar os meus agradecimentos a todos aqueles que contribuíram para a realização deste trabalho nomeadamente ao Sr. Doutor André Barciela Veras, Presidente do Instituto de Psiquiatria da UFRJ – IPUB, que amavelmente me concedeu o seu caso clínico, bem como Sr. Prof. Doutor Ricardo F. Allegri, Professor de Neurologia e principal investigador no CEMIC, Escola de Medicina e Instituto de Investigação, Buenos Aires – Argentina, pois sem eles este trabalho não teria o enriquecimento merecido.
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Paulo Teixeira
Artigo publicado no site www.psicologia.com.pt
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